Master Series Communication: “Novas narrativas para o posicionamento da marca empregadora em redes sociais corporativas” (Parte 2)
Por Aurora Ayres
“São nos momentos de grandes desafios que reafirmamos o valor das narrativas, se bem trabalhadas elas podem nos unir. As narrativas abrem nossos horizontes, mostram sinais de perigo. No mundo corporativo, as novas narrativas podem humanizar espaços e relações de trabalho”. Foi assim que Paulo Nassar, diretor-presidente da Aberje e professor titular da ECA/USP, deu início à Master Class “Novas narrativas para o posicionamento da marca empregadora em redes sociais corporativas”, realizada em formato online no dia 4 de agosto.
Este módulo também contou com a participação de Tatiane Torezan, gerente de Sucesso do Cliente do Workplace; Felipe Soares, gerente de Comunicação Corporativa e Guilherme Roque, analista de Comunicação Corporativa, ambos da Riachuelo e de Letícia Cabrera, gerente de Comunicação Corporativa da Gol Linhas Aéreas. (leia na primeira parte desta cobertura)
É preciso dar tempo para as narrativas
Ao abrir sua aula, Paulo Nassar frisou que as pessoas estão ‘obesas’ de informações e mesmo assim continuam com ‘fome’ de sentido e de significado. “Nesse sentido, elas podem ‘matar’ a fome por meio das narrativas que contextualizam principalmente os números, que são apenas dados frios quando não humanizados”, atestou o professor, destacando que, em um tempo que corre com grande velocidade com uma descomunal quantidade de informações, mais do que nunca é necessário dar tempo às narrativas, é preciso salvá-las em todas as suas formas.
Abordar um tema tão amplo demanda um primeiro entendimento: quando e como surgiu a primeira narrativa? “Podemos arriscar a partir de 300 mil anos atrás, com a origem do homo sapiens, quando alguém começou a transmitir para outro aquilo que experimentava. As primeiras narrativas estão na comunicação visual, nas pinturas rupestres, em que expressavam as experiências do mundo que viviam”, ressalta Nassar.
A primeiras narrativas míticas portanto, ressaltam a importância da experiência. “O que é vivido pela primeira vez relaciona-se com o tempo, o espaço e com o que o integra.Tudo isso memorizado e narrado constitui-se o que chamamos de primeira narrativa”. Nesse momento, Paulo faz um paralelo sobre a importância das experiências vividas no mundo organizacional, que marcam a memória das pessoas que dela fazem parte e as transformam. As narrativas que surgem desses processos são marcadas pela ligação entre aquilo que se faz e o que se diz; “o discurso alinhado à prática”.
Afinal, o que é narrativa? São várias as definições. Pode-se dizer que é uma história, um processo gradual, uma composição de fatos com começo, meio e fim, com a intenção de comunicar algo. Do ponto de vista de alguns autores, toda narrativa é um discurso com intenção de persuadir em algo, transformar um pensamento/comportamento. Para Paul Ricoeur, um dos grandes filósofos e pensadores franceses do período que se seguiu à Segunda Guerra Mundial, “narrativa é um artefato da linguagem que organiza a nossa experiência no tempo e no espaço”.
O comunicador é um cientista de narrativas
Mas, como criar narrativas inovadoras que tragam sentido e significado no meio da obesidade informacional e da vulgarização das narrativas do cotidiano? “As relações se consolidam nas narrativas. Um bom relacionamento conta com uma comunicação excelente. Nas relações humanas, dentro do ambiente do trabalho, é importante começar a examinar quais são os atributos contidos nas novas narrativas e como eles podem nos ajudar em uma comunicação corporativa”, acentua Paulo Nassar, enfatizando que são muitos os atributos das narrativas e explicou alguns deles durante a Master Class:
1) A narrativa explica o funcionamento do território, do país, da cidade, do universo, da empresa…
“A narrativa é o relato organizador do território, é como explicamos uma empresa, o universo corporativo dos processos quanto à necessidade de determinados protocolos, a importância de dar concisão à significação de alguma coisa”, explica o professor, salientando as narrativas mais curtas, baseadas em histórias reais, verdadeiras e criativas, sem tom burocrático ou protocolar. “Você é capaz de reduzir a significação de sua empresa a uma única palavra, som ou símbolo?”, provocou. Hipérboles, metáforas, metonímias e outras figuras de linguagem ou representações gráficas são possibilidades dessa significação.
Um bom exemplo é a campanha publicitária desenvolvida em Nova York, em 1977, estilizada como I love NY, dentro de um contexto de espaço público deteriorado e violento. Após muitas décadas essa marca continua forte e extremamente vinculada a essa cidade. Hoje, os turistas a identificam como um território ‘afetuoso’ e de paz. O famoso logotipo é usado por todos que substituem o NY por incontáveis nomes. “E quantas formas de narrativas potenciais concisas existem baseadas no humor, num emoji, num meme, referenciados em um afeto”.
2) A narrativa promove coesão social
É fato histórico que determinadas narrativas tem o poder de ligar milhões/bilhões de pessoas, numa escala ascendente, como as religiosas e as movidas por ideologias. Porém, essas escalas podem ser reduzidas para o âmbito familiar e de comunidades de interesses, por exemplo. “Podemos pensar em narrativas que produzem sentimentos de grupo. No dia a dia de uma organização, existe um esforço de equipe para cumprir metas e ultrapassar obstáculos; e as pessoas vão gradativamente adquirindo o sentimento do ‘nós’”, explica Nassar.
São os vínculos sociais e afetivos produzidos pelas narrativas. E como criar essas narrativas que reforçam sentimentos de pertencimento e que promovem o fortalecimento dos vínculos? Como as narrativas ainda podem manter a identidade, valores e cultura de uma organização? “Com certeza não são as narrativas autoritárias, aquela do ‘manda quem pode, obedece quem tem juízo’. Hoje, a diversidade é um valor corporativo e social importante, pois cria inovação. É preciso pensar em narrativas não-homogêneas, nem padronizadas e que estejam no contexto do mundo contemporâneo com muitas orientações e estilos para garantir o que chamamos de coesão social. Então a responsabilidade desse cientista de narrativas, o comunicador, está aumentando”, analisa.
3) A narrativa promove envolvimento e engajamento
Uma narrativa pode afetar e passar pelo sentido das pessoas, trabalhando não só o plano da objetividade da empresa mas também o plano da subjetividade (psiquê) das pessoas da organização. “É preciso refletir quais são os espaços e tempos que a sua comunicação está dando para essas singularidades? Mais do que simples feedbacks, devem ser espaços de compartilhamento do protagonismo individual em tempo real e visível para todos os integrantes da ‘comunidade’ empresa”, comenta Nassar, considerando comunidade como algo que sugere abrigo e proteção. “Muitas empresas estão abrindo espaços presenciais e virtuais para vivenciar coisas ligadas à saúde mental, espiritualidade, autoconhecimento, inclusão social, por exemplo, além de plataformas que promovem a discussão de temas que impactam a vida das pessoas, reforçando a ideia de engajamento”.
4) A narrativa promove a institucionalização da empresa e de seus líderes
A instituição, conceitualmente, é um tipo de organização amplamente reconhecida pela sociedade, por suas crenças e valores, por sua história e por seu respeito a aspectos ligados a ESG (sigla em inglês que designa “Environmental, Social and Governance”, isto é, meio ambiente, relações com a sociedade, integrantes e colaboradores, e regras de governança e cultura). “Essas empresas que são percebidas como instituições conseguem criar uma ‘armadura reputacional’, e fortalecer esse tipo de percepção ao comunicarem-se por meio de seus rituais, principalmente de consumo, produção, circulação e de logística reversa”, explica o professor. “As narrativas devem ser alinhadas para que possam ser feitas de P a P – do porteiro ao presidente -, pois o consumidor/cidadão quer saber se a empresa tem responsabilidade histórica entre elas a social, a ambiental, a econômica e a política”, complementa.
5) A narrativa promove e trabalha a abstração
Outro atributo trazido pelo professor para a Master Class é que a narrativa promove e trabalha a abstração. Mas como trabalhá-la? “Muitos esquecem os marcos importantes de uma história empresarial. Você quer valorizar ou superar tecnologias? Celebrar ou esquecer fundadores? E quanto a fusões e aquisições? Entender, preservar ou descartar marcos fundadores de uma empresa? Onde a sua empresa quer chegar e como ela quer ser vista no futuro? Quais serão as narrativas do amanhã da sua organização? É preciso respeitar a história de uma empresa, trabalhar essas memórias empresariais que podem levar as pessoas a viajar no tempo”, reflete.
6) A narrativa ritual valoriza o que foi naturalizado, vulgarizado pelo cotidiano empresarial
Quanta coisa boa é esquecida no dia a dia da empresa? Bons benefícios, bom ambiente de trabalho e outras questões acabam sendo classificadas como algo natural. “As pessoas estão burocratizando o que não deveria ser burocratizado. Os comunicadores devem olhar para toda essa dimensão para que todos possam valorizar o que foi naturalizado”, argumenta Nassar. “É preciso criar narrativas de reconhecimento adequadas aos colaboradores desses novos tempos, mapear datas importantes da história da empresa e das pessoas, dar importância tanto para as meta histórias quanto para as micro, atualizar padrões antigos e dar lugar a narrativas que privilegiam rituais”, completa.
Ao final de sua aula, o professor Paulo Nassar, lança uma última pergunta: o que é uma nova narrativa? “Eu diria que as novas narrativas de ontem, de hoje e do futuro – aquelas que surgem do ‘era uma vez’ ou ‘em um futuro distante’ – contém, de certa forma, a maioria dos atributos apresentados anteriormente, ou seja, da tradição, a partir do presente, surge a inovação”, conclui.
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