Lançamento do livro “Lobby Digital” pela Aberje Editorial debate a influência do cidadão nas decisões de governo e empresas
Um vídeo de uma celebridade no Youtube, uma live no Instagram com um deputado, uma campanha no Facebook. Qualquer ação para influenciar uma política pública via plataforma virtual é um lobby digital. Mas como a democracia reage ao universo das mídias sociais? Como esse jogo do lobby democratizado nesse novo ambiente acaba por empoderar o cidadão?
Essas e outras questões foram debatidas no dia 24 de agosto, durante live de lançamento do livro Lobby Digital Como o cidadão conectado influencia as decisões do governo e das empresas, de Renard Aron, publicado pela Aberje Editorial.
Mediado pelo cientista político Ricardo Sennes, o evento contou com a participação de Paulo Nassar, diretor-presidente da Aberje e professor titular da ECA-USP; Luciana Holtz, presidente do Instituto Oncoguia; e Fábio Rua, VP do Instituto de Relações Governamentais (IRelgov) e diretor de Relações Governamentais e Assunto Regulatórios da IBM para a América Latina. No final do encontro, foram sorteados cinco e-books do livro e um curso livre da Aberje.
Ao abrir a live, Ricardo Sennes, que assina o prefácio do livro, comentou o impacto do lobby digital nos debates públicos mundiais, que enseja um novo papel ao cidadão, o de stakeholder. “Ao empoderar o cidadão, muda-se até a previsibilidade do processo de discussão e definição de políticas públicas. Esse novo ambiente altera a dinâmica de todos os atores sociais, sob o ponto de vista das estratégias das organizações, de instituições e ongs e dos próprios governantes”.
A ideia de escrever o livro surgiu há cerca de quatro anos, quando Renard Aron percebeu que os governos começaram a incluir o cidadão comum nos debates e formulações de políticas públicas, coisa que as ONGs já faziam de forma efetiva convidando o cidadão a participar do debate e pressionar o poder público em temas de interesse coletivo e social. “Achei que era realmente necessário entender esse novo mundo e comecei a ler sobre isso; sobre como o todo funciona, sobre o que não é explicado pelo comportamento individual, questões como sistemas em rede, como uma ideia se propaga nas redes sociais e pensei em explicar isso dentro do mundo digital, em como levar os conceitos tradicionais da teoria do Relgov para o universo virtual”, explicou o autor.
Cidadão stakeholder
Artistas, comediantes, youtubers, empresas estão se utilizando das plataformas digitais para fazer lobby. Mas não é preciso ser conhecido pelo público para defender uma causa na web. O cidadão pode ser elemento-chave do processo de construção de políticas públicas, levando a visão de um grupo de interesse diretamente ao decisor. Batizado pelo autor como ‘cidadão stakeholder’, ele passa a ser o mais novo ator desse meio e tem plena condição de se posicionar ativamente na defesa de questões sociais.
Durante a live, Aron explicou que a lógica e a dinâmica do lobby digital é bem distinta do jeito tradicional de fazê-lo e contou aos participantes quem já está fazendo esse tipo de lobby, como se faz e sobre o quê se faz lobby. Primeiro, explicou como surgiu o conceito de stakeholder. “Esse termo vem de longe, por volta de 1708. O stakeholder era aquele que segurava o dinheiro da aposta entre duas ou mais pessoas. Ele era a parte não interessada, mas isso mudou ao longo do tempo”, enfatizou.
O conceito agora é utilizado no ambiente empresarial por: empregados, sindicatos, moradores do entorno de uma empresa, supply chain ligada a uma fábrica, por exemplo, acionistas, ou seja, todos com interesse direto na questão. “O que acontece com o cidadão stakeholder é diferente. O que o move são os valores, a preocupação com o global, com o todo. A pessoa entra no debate não porque tem impacto direto nela mas porque vai de encontro aos seus valores. Este cidadão participa do debate, o que é muito diferente da lógica do lobby tradicional”, ressaltou Aron. “Pressão popular, esta é a dinâmica que difere entre o lobby tradicional e o digital. E o livro tenta mostrar um pouco as semelhanças e as diferenças entre eles”, complementou.
As narrativas do lobby
Ao contextualizar as ações da Aberje ligadas à questão do lobby no Brasil, desde a fundação da entidade há 53 anos, o diretor-presidente da Aberje, Paulo Nassar, afirmou que as narrativas do lobby feitas nos últimos 50 anos tem sido muito ruins, pois comprometem a efetividade de boas políticas, de bons planejamentos e de boas ações do mundo organizacional. “Aquela ideia maniqueísta de identificar o lobby como algo demoníaco, muitas vezes se concretiza exatamente nas narrativas ruins. Nos últimos 10 anos, a gente vê setores importantíssimos para a sociedade serem marcados por essas narrativas ruins”, argumentou.
Nassar destacou ainda que a Aberje não apenas enxerga o tema, mas participa dele. “Nós, comunicadores, olhamos esse tema sempre do ponto de vista da narrativa, sempre do território do texto em sua dimensão audiovisual, comportamental ou escrita, que nos aproxima das outras áreas relacionais que existem hoje”.
O presidente da associação frisou que, academicamente, as relações governamentais estão situadas dentro das ciências sociais aplicadas, onde existem outras áreas relacionais. “Numa sociedade alavancada pela tecnologia e pela democracia, como Renard destaca brilhantemente no livro, temos a seguinte situação: todos os temas que envolvem hoje ação organizacional vão provocar inúmeros pontos de vista, opiniões diferentes, controvérsias, conflitos etc. É aí que entram as narrativas que, ao circularem alcançam legitimidade”, complementou.
Portas abertas ao lobby
Reuniões a portas fechadas em um gabinete, todos de terno e gravata e ambiente extremamente protocolar vão acontecer cada vez menos, porque as organizações precisam ser cada vez mais transparentes e mais éticas. Esta é a visão que o VP do Instituto de Relações Governamentais (Irelgov), Fábio Rua, trouxe durante a live. “A sociedade civil é carente de interlocução com o governo. Essa história de lobistas acaba com a digitalização do lobby. Todo mundo tem o direito de se comunicar e a comunicação está umbilicalmente ligada à atividade do Relações Governamentais”, disse.
O executivo frisou que é essencial que as organizações comuniquem não só sobre seu produto, mas como ele chega à prateleira e de que forma consegue mobilizar o consumidor para além da sua embalagem. “O engajamento dessa empresa num ambiente público é hoje cada vez mais notado como uma forma de diferenciar empresas que merecem atenção e respeito das que não merecem”, conclui.
Na ocasião, Fábio comentou que o mundo digital, curiosamente, foi descoberto antes pelos políticos do que pelas próprias empresas. “Percebo uma grande necessidade dos políticos de se comunicarem não só postando mas comentando e respondendo dúvidas dos seus eleitores e apoiadores. Vamos ver cada vez mais as empresas adotando um papel que no passado era visto como autopromoção, como um risco enorme que não se podia controlar. Existem riscos, mas existem muito mais oportunidades de se mostrar a que veio, o que defende, etc. É o fim do corporativismo das causas e ações específicas e vida longa ao corporativismo das causas, das pessoas e empresas que de fato se engajam em causas que farão a diferença para o consumidor final e para a sociedade”.
Mudança na lei
Ao longo do livro, mais de 45 casos são utilizados para ilustrar os diferentes eventos envolvendo redes sociais, atores sociais e políticas públicas. Para Aron, a diversidade de casos remete à ideia de que, em princípio, todo tema público potencialmente pode ter uma dimensão de ativismo digital. Um dos cases abordados é o Instituto Oncoguia – ONG dedicada a ajudar pacientes com câncer por meio de ações de informação, educação em saúde e advocacy.
Em 2011, o instituto iniciou uma campanha que pretendia incluir a terapia oral para o tratamento de câncer no rol de reembolso dos planos de saúde particulares. Mais de 18 mil assinaturas (14 mil online via hotsite e 4 mil via coleta) foram entregues à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), mas esta argumentou que seria necessário uma mudança na lei. O Oncoguia não desistiu e conseguiu contato com uma senadora. Depois de muitos obstáculos, finalmente a lei foi sancionada, em 2014.
“Foram três anos para vermos o PL da quimioterapia oral ser aprovado. Tivemos um envolvimento muito ativo da nossa rede de pacientes e uma série de ações, etapas importantes para que o projeto seguisse em votação”, contou a presidente do Instituto, Luciana Holtz. “Trabalhamos muito com informação e orientação para que a gente consiga melhorar o cenário onde os nossos pacientes estão inseridos, que ainda é de políticas públicas ineficazes, muito desiguais, e demoradas. O câncer deve ser tratado de forma prioritária em nosso país”, completou.
O livro está disponível em e-book para compra na Amazon. Acesse o link aqui.
Assista à íntegra no canal da Aberje:
https://www.youtube.com/watch?v=K9vMEexfpTI&feature=youtu.be
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