05 de setembro de 2024

Eugênio Bucci e Joel Pinheiro refletem com conselheiros da Aberje sobre o papel e desafios dos comunicadores no debate público atual

Encontro dos Conselhos da associação teve painel com Professor Titular e Superintendente de Comunicação da USP, Eugênio Bucci, e o filósofo e comentarista, Joel Pinheiro da Fonseca
Yacoff Sarkovas, Hamilton dos Santos, Joel Pinheiro, Malu Weber, Eugênio Bucci, Paulo Nassar e Renato Gasparetto

No dia 29 de agosto, as três instâncias de governança da Aberje (os Conselhos Deliberativo, Consultivo e Fiscal) se reuniram em São Paulo, em uma ação inédita de integração. Na agenda, um debate sobre “Comunicação, Negócios e Poder: cenário para comunicadores empresariais no debate público contemporâneo”. Com a mediação de Malu Weber, Presidente do Conselho Deliberativo da Aberje e VP de Comunicação da Bayer Brasil, o debate contou com a presença de Joel Pinheiro da Fonseca, comentarista  da Globonews e membro do Conselho Editorial da Folha de São Paulo; e Eugênio Bucci, Professor Titular da ECA-USP, Superintendente de Comunicação Social da USP e membro do Conselho Consultivo da Aberje. Ambos fizeram ponderações sobre o tema proposto na agenda, cujo objetivo foi aprofundar o entendimento sobre o papel dos comunicadores sobre democracia e a sua relação direta com o excesso de informação, desinformação e influência dos algoritmos.

Cenário para comunicadores empresariais

Traçando um paralelo com a ideia de democracia e retórica na Grécia antiga, Joel Pinheiro da Fonseca afirmou que a habilidade de convencer, persuadir e ganhar a confiança do outro permanece como uma das principais habilidades necessárias hoje no debate público. “Acredito que estamos em uma sociedade cada vez menos baseada na autoridade e mais dependente da retórica”, afirmou. Em sua visão, a democracia atual torna cada vez mais frequentes os conflitos em função da existência plural de interlocutores e a descentralização de narrativas, o que a fortalece. 

Outro desafio apontado foi o impacto das redes sociais, que, segundo Fonseca, a partir da democratização da opinião e da informação, é possível observar um aumento de conflitos, de discordâncias e de elevação de “temperatura” nas discussões, exacerbadas também pela disseminação da desinformação e narrativas conspiratórias.

Para Bucci, hoje, horizontalmente, nunca tantas fontes puderam alcançar tantas pessoas. Contudo, verticalmente, ele sugere que estamos vendo uma concentração e uma redução significativa no número de players no setor de comunicação. “No passado, discutíamos o monopólio da mídia por um número reduzido de famílias — às vezes eram 16, outras vezes 20. No entanto, o cenário atual é controlado por quatro ou cinco grandes conglomerados de mídia no mundo”.

Segundo ele, “nunca houve tanta gente falando e tendo acesso à mídia quanto uma pessoa com um celular, mas o controle sobre o fluxo de informações não é democrático”, reforçando que ninguém sabe exatamente como ele é regulado ou impulsionado pelos conglomerados de mídia.

Trazendo uma visão complementar à proposta por Fonseca, Bucci faz uma analogia das redes sociais da atualidade e os jornais do século 19, que nem sempre priorizavam a verificação dos fatos. Ele afirma que a prática de ouvir o outro lado surgiu mais tarde e que a informação passou a ser vista como um recurso valioso.

“O jogo mudou, o megafone pluralizou e a relação com a informação também. A única fonte de informação não existe mais, o consumidor tornou-se protagonista e a parcialidade aumentou. Se você não provar a veracidade das suas afirmações, perderá o crédito. A democracia foi ressignificada e a retórica chegou para ficar”, concluiu Malu Weber.

Algoritmo e confiança como antagonistas 

Renato Gasparetto, Presidente do Conselho Consultivo da Aberje, questionou Fonseca se, como sociedade, já alcançamos a maturidade para tomar decisões de forma independente, ou se nossas escolhas estão sendo guiadas por algoritmos com baixa transparência. Pinheiro defendeu que a sociedade em transição vive hoje um nível de conflito que questiona instituições, fatos e narrativas sobre a realidade e que as pessoas deixaram de acreditar nas instituições tradicionais, como a imprensa e o poder judiciário, devido a uma série de fatores e eventos que abalaram essa confiança.

Para Pinheiro, a mente humana tende a selecionar informações que justifiquem nossas crenças e interesses, ajustando o que acreditamos ser verdade para alinhar com nossos interesses pessoais e posições sociais.  “Os algoritmos certamente criam problemas e influenciam o comportamento, mas a questão mais ampla é sobre como a mente humana lida com informações e crenças”, reforça.

Cristiana Xavier de Brito, Ricardo Viveiros, membros do Conselho Consultivo da Aberje, e Eugênio Bucci convergiram na defesa da educação como um elemento central na preparação de comunicadores e cidadãos para os desafios da era digital.

Brito questionou se existe algum dado ou pesquisa que mostre como a população, especialmente em termos de níveis educacionais, é mais ou menos influenciada por essas plataformas e como podemos usar a educação para ajudar as pessoas a se tornarem consumidores mais críticos e informados.

Para Bucci, uma das possíveis respostas perpassa pelo algoritmo. “Na democracia, o Estado deve ser transparente, ou pelo menos deve tentar ser. No governo do fluxo de informações, não vemos nada, enquanto os algoritmos sabem tudo. Esse é o problema: o algoritmo sabe tudo o que fazemos. Se isso é bem ou mal usado é outra questão, mas a nossa vida é totalmente rastreada e o sistema que faz esse rastreamento não é transparente. Essa discussão precisa ser enfrentada com regulação”, completa Bucci.

Em complemento à explanação dos painelistas, Ricardo Viveiros reforça que, nesse sentido, a educação emerge como uma responsabilidade também das empresas, e não somente das esferas governamentais e civis. É necessário intensificar iniciativas que integrem a educação com práticas de comunicação, garantindo que os profissionais estejam equipados para lidar com a complexidade da pluralidade de narrativas, mas também com o abismo da desinformação e, principalmente, com a discussão emergente do impacto que os algoritmos têm nos fluxos de comunicação.

O encontro das três instâncias de governança da Aberje é uma ação especial, que complementa a agenda Estatutária da entidade, com o objetivo de  fortalecer suas estruturas e integrar atores institucionais importantes para a rede associativa e para o mercado de comunicação.

Luís Eduardo

Relações Públicas pela Universidade Metodista de São Paulo (UMESP), Formações em Diversidade e Inclusão Social e Direitos Humanos; Marketing e Comunicação Digital pela Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP). Em 7 anos de carreira corporativa, liderou projetos em mais de 20 grandes empresas e instituições, com vasta experiência em Gestão e Planejamento de Projetos de DEI e Comunicação. Atua na área de Relações Institucionais e Internacionais da Aberje.

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