Viver se aprende vivendo
A longevidade é a nova diversidade. Mais de 25% da população brasileira, em torno de 38 milhões de habitantes tem 50+, número maior de pessoas que muitos países da Europa. Esse percentual não para de crescer e, em 2050, perto de 50% da paisagem estará repleta de cabelos brancos. Os longevos estão por aí. Gerações que não esperavam viver tanto, como a dos pais dos 50+, usufruem um tempo adicional de vida não planejada. Aqueles que se encontram no meio da jornada vislumbram um caminho bem mais longo do que imaginavam. E os iniciantes começam a entender que a coisa vai bem longe. E você? Em que trecho está?
A divisão entre passado, presente e futuro não dá mais conta da onda de mudanças que nos atingem. Qualquer que seja sua idade agora, você irá se deparar com situações inusitadas. Os futurólogos falam de Inteligência Artificial, Algoritmos, seres híbridos vivendo com órgãos feitos por impressoras 3D, transplante de cérebro, e por aí em diante. Nesse mundo Black Mirror, olhamos para o nosso cotidiano meio analógico e não conseguimos perceber tantas mudanças assim. Será que não é apenas ficção? Como gosto muito de filmes e séries, esse pensamento me remete a um filme chamado “O Impossível”, baseado num relato de sobreviventes de um tsunami que atingiu a Tailândia em pleno feriado de ano novo. Após a festa na praia com fogos e toda a parafernália de celebração, o dia seguinte estava muito calmo, até demais. Os pássaros e animais saíram em debandada e o silêncio reinou até a chegada das gigantescas ondas fatais.
Esse hiato entre a tendência e o fato está cada vez mais curto. A percepção aguçada, a leitura do ambiente e suas nuances é fator de sobrevivência, ou melhor dizendo, de vivência. Alongamos nossos anos de circulação pela Terra, agora resta saber como gerenciar uma sociedade cada vez mais prateada numa cultura adolescente. Se você fizer uma rápida pesquisa de imagens e mensagens sobre o envelhecimento, terá inúmeras dicas de como fugir dele, algumas bem criativas. Mas o tempo é astuto. Não é domado por truques. Parece lento, mas quando você se dá conta, ele já te levou. Ninguém foge. E agora? Está na hora de construir uma nova cultura onde o velho, o novo e o que vai chegar, pensem juntos. Passado, presente e futuro dançam uma música feita por novos instrumentos. Há beleza latente a ser descoberta.
Pessoas interessantes e inteligentes propagando, criando a biblioteca (palavra antiga) dessa nova cultura. Pensadores como Yuval Noah Harari em seu livro: 21 Lições do Século 21, que aponta para um futuro bem próximo, pertinho mesmo, onde as edificações e certezas esfarelam. O venerado mundo digital não se restringe aos computadores, celulares e milhares de aplicativos. O conhecimento a forma de interagir e ser, se desmaterializou e escorre pelo ralo. Ou procura um recipiente de decantação e humanização.
Você deve estar perguntando o que tudo isso tem a ver com o envelhecimento, a longevidade. Pense na sua avó, ou alguém com mais de 75 anos que você conheça. Essa pessoa viu desde a chegada do homem à lua, até o celular e as pessoas tirando fotos de si mesmas pela rua. Uma boa parte dessa geração mais antiga, manda whatsapp e tem celular. Imagine o caminho percorrido por essas mentes que viviam sem televisão nas suas salas e hoje são invadidas por câmeras. Agora imagine o que você, seus filhos e os filhos deles verão. Certamente teremos saltos tecnológicos, no melhor dos casos. Ou um retrocesso ambiental e social como rebote de excessos mal calculados. E os longevos continuarão pelo planeta, consumindo, deixando suas pegadas ecológicas até que desapareçam.
E continuar pelo planeta será uma grande aventura. “Navegar é preciso, viver não é preciso”. O jogo de palavras de Fernando Pessoa nunca foi tão atual. A navegação conta com instrumentos sofisticados, a questão é a rota. Ficou mais longa e sobrou vida. O mapa não serve mais, o jeito é fazer outr, pois há léguas pela frente. Afinal, viver se aprende vivendo.
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