Vai começar o SXSW 2024, a Disney dos criativos
Acabo de pisar mais uma vez em Austin, no Texas, para o meu oitavo SXSW. Meu ano corporativo começa literalmente depois deste evento, que acontece há 38 anos, sempre no feriado conhecido como o “spring break” americano.
O SXSW é maior evento de economia criativa e inovação do mundo. Reúne milhares de profissionais destacados de diferentes áreas de atuação para descobrir as tendências, fazer novas conexões, numa espécie de reprodução real de De volta para o futuro ou Perdidos em Marte.
É sempre nesta semana que o meu cérebro e o meu eu dão um nó. Um momento em que opto por descobrir temas que não domino, e para conhecer as pessoas mais criativas do mundo. As sinapses entre os diversos conteúdos e as provocações de cada situação que acontecem nesses dias se unem em soluções e estratégias, e a partir daí novas ideias e projetos são imediatamente construídos na minha mente.
São tantas opções, programações, agendas de inovação e gente interessante que por um segundo você fica parado, com uma sensação de espanto e pura adrenalina. Um misto de “como eu nunca pensei nisso antes” com “meu Deus, que velocidade toda é esta? Como estamos atrasados”. É a Disney dos criativos, que encanta e apavora.
O SXSW tem três programações principais: interatividade, filmes e música. Também tem uma vasta agenda dedicada a gaming e Comédia, além de muitas experiências de marcas em casas espalhadas pela cidade. A conferência, minha principal fonte de interesse, inclui keynotes e sessões com convidados para falar de assuntos variados dentro do espectro de inovação.
São instalações interativas, demonstrações de tecnologia de ponta, exposições de arte, apresentações performáticas e muito mais. Tudo se mistura com um conceito de provocar, questionar, avançar as fronteiras do pensamento e ampliar o conhecimento sobre como a tecnologia se insere na transformação do mundo.
A primeira vez que pisei no SXSW, senti a cidade que exala uma atmosfera universitária e cool, e fui imediatamente impactada com um workshop sobre agricultura no espaço.
Sabe aquela plantinha que aparece no filme Wall-e como algo totalmente inusitado? Então, o papo foi sobre as tecnologias do laboratório de plantas de código aberto do programa da Agência Espacial Europeia. Eles estavam coletando dados científicos para criar um ecossistema capaz de garantir oxigênio, água e comida aos astronautas nas longas missões.
O clima do SXSW é assim: uma massa imensa de jovens profissionais, de diferentes tipos e estilos, ávidos para ouvir e trocar conhecimento sobre o que estamos vendo no mundo da comunicação e da economia criativa e as tendências da inovação global.
“It’s a pushing brain’s event”, um alemão me disse certa vez na fila de uma palestra, enquanto seus colegas (um grupo de três CEOs de multinacionais de engenharia de Berlim) apostavam comigo em quanto tempo será possível o ser humano ter a opção de morar em outro planeta.
Ver muito menos do que gostaria é um aspecto frustrante do evento, decorrente da imensa oferta de painéis, palestras e experiências das mais incríveis acontecendo no mesmo horário. São previstos mais de 5 mil palestras e painéis nesta edição do SXSW, que começa nesta sexta, dia 8 de março.
Não é a toa que a revista Forbes considerou o SXSW como o maior e mais diverso evento focado em conexão de pessoas e de tecnologias. Foi lá que o Twitter, o Tinder, o Foursquare e o Medium foram apresentados pela primeira vez, anos atrás, como lançamentos e tendências.
A tatuagem que o SXSW deixou marcada em mim é a certeza de que a grande revolução desta década não está centrada nas novas formas de tecnologia, mas na evolução dos relacionamentos. E essa ficha caiu quando assisti a um debate, no espaço da Dell Technologies, sobre os avanços da inteligência humana versus o dos robôs. Isso aconteceu no SXSW de 2018. Lá, estudiosos de tecnologia e professores PHDs de laboratórios de universidades renomadas, como o MIT, dividiam o palco com um robô. Foi quando perguntaram se seria possível um robô ser preconceituoso. A resposta unânime foi que o preconceito do robô existe, pois ele é programado por humanos.
Então, de um lado, a revolução tecnológica avança em velocidade assustadora e produz mudanças de comportamentos e de produtividade, trazendo ganhos imensuráveis para todos com novos usos de computação quântica, robótica, inteligência artificial, realidade virtual, “machine learning”, tecnologias de blockchain etc. etc.
E, na direção contrária, as relações humanas são cada vez mais caóticas, irracionais e em constante mudança. A psicoterapeuta belga Esther Perel, uma das grandes estrelas do festival, previu que as “relações humanas passarão por mudanças ainda mais significativas nos próximos anos”. Ela defende que “a qualidade dos nossos relacionamentos é o que determina a qualidade da nossa vida. E as conexões e os limites que estabelecemos com as outras pessoas é o que nos dá o senso de existir, de felicidade, de bem-estar”.
Dialogar exige negociação, e negociação é a base dos relacionamentos modernos. “As conversas se tornaram a peça central dos relacionamentos. E esse é um desafio muito difícil pois somos testados o tempo todo a falar sobre algo que nunca tínhamos falado, de assuntos que não sabemos como tratar, que não dominamos o vocabulário certo e que na maioria das vezes nem tratamos dessas coisas conosco antes”, afirmou Perel, durante uma de suas exposições no South By .
Veja toda a palestra de Esther Perel (em ingles):
E no meio desse emaranhado todo, surgem três palavrinhas que eu escutei exaustivamente na minha jornada intensa de muitos SXSW e que norteiam a minha crença na construção de reputação de marcas e instituições: clareza, simplicidade (com consistência) e disponibilidade.
Daí você vai me perguntar. E isso é novidade? E você está certo: não é. Mas eu devolvo a pergunta a você: nós estamos construindo reputação e relacionamentos baseados nessas três palavrinhas mágicas? Aposto que não. É só olharmos o noticiário de hoje que veremos a grande confusão pautando tudo que nos cerca.
O desafio que está posto é o da necessidade de estabelecer conexões verdadeiras. E isso significa ir até as pessoas e não transferir essa responsabilidade para os meios meramente tecnológicos.
É possível voltar à vida normal depois de uma semana no SXSW?
Volto sempre para casa anestesiada e tentando me entender… e encontrar, formas de contribuir para que todas aquelas coisas incríveis exibidas no festival sejam aplicadas no Brasil. Tudo que vivo em Austin abre portas inexploradas em labirintos da minha mente que eu mesmo desconhecia. Percorrê-los às vezes me apavora, mas se tornou um hábito irresistível.
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