Um poder de Estado
Muito se tem falado do poder das empresas no mundo contemporâneo. Um poder que é a fonte e solução dos maiores fantasmas que rondam a humanidade: a poluição, o aquecimento global, as guerras por energia e água, a migração forçada pela miséria.
Um poder empresarial que faz os corações e as mentes de bilhões de consumidores, enquanto provocadores de desejos voltados aos seus produtos; alguns desses produtos verdadeiras bugigangas poluidoras que o consumidor poderia adiar a compra ou simplesmente não consumir.
Edward Bernays, tido como o pai intelectual das Relações Públicas, criou nos anos 1920 e 1930 estratégias persuasivas, munido de pesquisas e psicologia de massa, para que as indústrias virassem máquinas de vendas, sem nenhuma consideração pelo que se chama hoje de produção sustentável. O resultado disso está aí nas montanhas de lixo e na poluição que o consumo desvairado está produzindo.
Quando consultamos a memória da polis, vemos o poder corporativo fazendo e desfazendo governos. O socialista chileno Salvador Allende foi deposto do poder, em 11 de setembro de 1973, por uma armação sinistra que juntou multinacionais poderosas, políticos e militares fascistas.
No mundo do brilho fashion, a empresa induz comportamentos e tendências sociais. Enfim, esse é um poder que nos faz respirar, viver as empresas o tempo todo e que tem na comunicação empresarial o seu maior e melhor braço de guerra.
Empresa protagonista
Semana passada tivemos mais uma comprovação dessa força empresarial na decisão de duas grandes redes varejistas norte-americanas, uma delas a Wal-Mart, que resolveram limitar a venda de pacotes de arroz para os consumidores, diante da possibilidade de um desabastecimento em suas gôndolas, em razão de notícias da falta de commodities para alimentar gente. Explico: soja virou comida de gado e milho está se transformando em combustível para a frota norte-americana de automóveis.
Os megavarejistas norte-americanos, em conseqüência de suas escalas econômicas e influências nas cadeias produtivas, demonstraram que, cada vez mais, têm atributos organizacionais, entre eles o poder, que eram identificados apenas no âmbito dos Estados.
Agora, a grande empresa também regula mercado e qualidade de produtos, é protagonista importante em temas como inflação, emprego e educação. Em lugares onde o Estado é fraco, a empresa é a escola e o médico, que mostra para a comunidade a importância de se lavar as mãos, de se beber água fervida, reciclar lixo, entre outros itens que aparecem na comunicação de responsabilidade social.
Mundo minado
No Brasil, a rede de supermercados Pão de Açúcar criou uma série de postos de reciclagem de papéis, plásticos, metais e óleo de cozinha. Além disso, Pão de Açúcar, Carrefour e Wal-Mart anunciam constantemente controlar a qualidade e a segurança alimentar daquilo que oferecem aos seus consumidores, esses temas que são outros fantasmas do mundo moderno. Depois de bebermos leite com soda cáustica, estamos comendo alface e tomate recheado de agrotóxicos, como anunciou a Folha de S.Paulo, em sua manchete principal de 24 de abril.
Mais um aspecto ressaltado pela crise alimentar mundial é que as megaempresas são na verdade empresas-Eestado. Os seus dirigentes são como presidentes de países, o que deveria lhes impor uma nova educação, não mais voltada só para os acontecimentos de suas linhas de produção e escritórios, mas voltada para a rede social, econômica e ambiental na qual a empresa é apenas mais um importante participante. Nessa rede social, a empresa faz parte do problema e da solução.
A nova educação corporativa exige comportamentos democráticos, em que o dirigente empresarial deve ser um relacionador. Alguém que fale, que se expresse, que seja um líder da comunicação empresarial. E entenda que um mundo cada dia mais minado de temas complexos, como o da crise alimentar, exige o tempo inteiro que as empresas expliquem as suas ações e participem da discussão dos temas da agenda pública.
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