05 de setembro de 2023

Segurança psicológica: eixo das relações profissionais

Parece um tanto curioso clamar para que as organizações coloquem as pessoas no centro, mas é um tema urgente
(Imagem: Freepik)

Publicado originalmente no Meio&Mensagem em 30 de agosto

Estamos diante de um momento de transformação – ou ao menos questionamento – nas relações entre pessoas e organizações. Trata-se de um novo pacto cujo desenho está em curso, mas já evidencia contornos muito bem definidos. A troca funcional muitas vezes apresentada como eixo na conexão profissional-empresa passa a abarcar, agora, outras variáveis.

O eixo deste contrato é a segurança psicológica. E cabe começarmos com uma definição. Segundo a editora Amy Gallo, inspirada por Amy Edmondson, “a segurança psicológica da equipe é uma crença compartilhada (…) de que não há problema em correr riscos, expressar suas ideias e preocupações, fazer perguntas e admitir erros — tudo sem medo de consequências negativas”.

E podemos ir além. Em recente estudo conduzido pela consultoria de gestão United Minds, a segurança psicológica (e no cargo ocupado) é a preocupação número um de trabalhadores globais no momento de definir o “emprego ideal”.

Por trás disso, é inevitável pensar na cultura do medo e tratamento injusto que, por vezes, permeia as relações laborais. Embora inaceitáveis, tais situações são colocadas sob um extenso guarda-chuva de justificativas frequentemente ligadas à “busca por resultados”.

No mesmo estudo da United Minds, o suposto trabalho dos sonhos – ou que ao menos não gere pesadelos – está ligado a outros fatores, como um ambiente de confiança, o fomento ao significado do que se faz na empresa, recursos para ter êxito na função, regras claras para o desenvolvimento profissional, uma liderança solidária e próxima, bem como a flexibilidade para definir o lugar que o trabalho ocupará na identidade de cada sujeito. Nada disso despreza, claro, um pacote justo de salário e benefícios.

Uma análise mais atenta nos faz perceber a segurança psicológica como um aspecto transversal a todos os enumerados na pesquisa. E, para além, necessita ser contemplado não somente de maneira generalista, mas sobretudo quanto à singularidade dos profissionais.

As formas de trabalho emergentes, principalmente a remota, jogaram luz sobre questões até então pouco abordadas pela alta gestão das organizações. Talvez a singularidade seja a principal delas. Isso porque se tornou difícil tratar equipes de modo uniforme, ao passo que a visibilidade dos contextos individuais se mostrou com particular ênfase com as forçosas mudanças causadas pela pandemia.

Isso demanda das lideranças e pares um olhar cuidadoso às histórias, trajetórias, medos, ansiedades e desejos dos sujeitos que se reúnem em um ambiente profissional. Discursos e práticas que não consideram este nível de detalhe acabam sucumbindo por descrédito ou baixa adesão.

Parece um tanto curioso clamar para que as organizações coloquem as pessoas no centro, mas é um tema urgente. O fomento a um ambiente seguro psicologicamente entende a condição humana de cada qual e, em vez de eliminar nossa falibilidade e vulnerabilidade, considera-as na equação das relações.

Outro elemento intimamente ligado ao tema é o trio diversidade, equidade e inclusão. Este processo é inócuo caso não coloque a segurança psicológica como um pilar.

No limite, estamos falando de convívio civilizado. Ouvir com atenção, fomentar conversas, estimular o aparecimento de novas vozes e promover a visibilidade do que é importante – positiva ou negativamente. Relações maduras demandam este patamar de clareza, consideram o sofrimento coletivo, bem como o individual e não se limitam a acolhê-lo – mas também ativamente procuram formas de mitigá-lo ao menos no campo do contrato laboral.

A finalidade de uma empresa, repito, não dá a ela um salvo-conduto para tirar os sujeitos do centro da perspectiva. Mais que um fator crítico de sucesso, é uma questão de responsabilidade. O convite à ação está feito.

Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor.

Rodolfo Araújo

É vice-presidente da United Minds na América Latina. Consultor com mais de 20 anos de experiência em projetos de comunicação e branding, tem certificado na metodologia PROSCI de Gestão da Mudança e, como facilitador de treinamentos e workshops cocriativos, liderou dezenas de atividades em grandes corporações à procura de uma visão, plataformas de mensagens-chave ou design de novos produtos e serviços. Trabalhou por sete anos como líder das unidades de negócio de Insights, Branding and CSR na Edelman Brasil. Tem, ainda, passagens por consultorias de gestão de marca, comunicação e gestão pública – sempre à frente de projetos. Por um ano, trabalhou na ONG mais importante de advocacy em educação pública do Brasil, o Todos Pela Educação, estruturando do zero toda a área de comunicação, marketing e engajamento. Rodolfo é jornalista, mestre em comunicação e com especializações em estratégia pelo Insead e gestão do conhecimento pela FGV. Já venceu o prêmio Editora Globo de Jornalismo 2011 na categoria Educação e Cultura. É autor do livro "E se colocar pimenta?", sobre a marca de varejo Chilli Beans, co-autor dos livros "Reputação" (Editora Leader, 2021), "Comunicação Organizacional" (Summus, 2021), além de palestrante e professor em diversas escolas do País.

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