Proteste, você está sendo gravado
Em nossa sociedade, a produção intensiva por meio de meios amadores e industriais, e em tempo real, de informação em todas as suas formas, reduziu o indivíduo a uma figura de retórica. Na rua e em casa, pensadas aqui como metáforas do que é público e privado, a pessoa simples, aquela identificada por um número de Registro Geral (RG) ou pelo Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) – independentemente da sua vontade de ter a sua imagem e dados registrados e divulgados em um horizonte global – perdeu o seu direito de passar a vida delicadamente, silenciosamente, deixando apenas os pingos de suor originados do trabalho honesto e como recompensas expressas em prazeres.
Ter o corpo violado em imagens e narrativas não autorizadas é um risco que está à frente de cada um de nós, como são os riscos macroeconômicos, ambientais, sociais, tecnológicos, legais, financeiros, políticos e físicos. O que é chamado de governança corporativa gerencia, avalia e até previne uma gama extensa de riscos e para isso coloca instituições, áreas e profissionais para defender a imagem das empresas. O pobre indivíduo tem a sua proteção enquadrada em grandes abstrações como os direitos humanos, os ministérios públicos e as constituições nacionais. No cotidiano, os fatos mostram um indivíduo desprotegido legalmente da máquina fotográfica invasiva do celular, das formas digitais de bullying, da calúnia, injúria e difamação digitais, dos materiais não autorizados e disponibilizados na internet especializada em audiovisuais e nas chamadas redes sociais.
Avatares envelhecidos e desconectados do tempo
A Constituição Federal brasileira de 1988 destaca claramente a inviolabilidade da honra e da imagem das pessoas, o direito à privacidade, à intimidade. No entanto, de lá para cá apareceu, alavancada pelas tecnologias digitais, toda a sorte de Big Brothers governamentais e os ligados às grandes corporações mediáticas tradicionais e às novas, como o Google, Microsoft e as teias digitais do Orkut, Facebook e Twitter. Articulados com essas megaredes digitais estão os Little Brothers, versões atualizadas dos paparazzi, indivíduos que esquadrinham as vidas dos simples mortais, das figuras públicas e das celebridades, arrebentando com identidades, imagens e reputações. E a defesa cotidiana atualizada do princípio constitucional ligado ao direito à privacidade no ambiente dos tribunais não acontece com a velocidade e a eficácia de um mundo que se locomove à velocidade da luz.
A proteção à privacidade nesse novo ambiente de informação e comunicação intensiva é um tema que não chegou com força ao Legislativo e, também, aos debates travados pelos candidatos das eleições presidenciais deste ano. Dilma e Serra discutem ainda um mundo sem internet, sem redes sociais e sem a parafernália tecnológica que explodiu os muros que separavam a casa do ambiente das ruas. Talvez por isso estejam com as suas imagens parecidas com avatares envelhecidos e desconectados do nosso tempo.
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