Na comunicação, caem por terra influencers sem utilidade e erguem-se, aos poucos, os curadores de conteúdo
Pensar é uma das atividades mais prazerosas e produtivas do ser humano. É o que nos distingue das demais espécies neste planeta e é por meio do pensar que formamos ideias, resolvemos (e criamos) problemas, refletimos, interpretamos e analisamos informações, fatos, emoções e experiências – contando com a razão, a imaginação e a memória –, bem como tomamos decisões interagindo neste mundo.
Mas, infelizmente, pensamos cada vez menos. Porque pensar dá trabalho, cansa, exige tempo, algum equilíbrio, bom senso. Como disse Carl Jung (1875-1961), psiquiatra e psicoterapeuta suíço, fundador da psicologia analítica: “Pensar é difícil, por isso a maioria das pessoas prefere julgar”.
O advento das telas e das redes sociais em nossas vidas vem sequestrando nosso cérebro em uma escala assustadora. Hoje em dia, pensamos menos do que ontem porque só nos atemos a fatos (ou pretensos fatos) e nos damos por satisfeitos, inclusive sem verificar se o fato é verídico ou “fabricado”, sem nenhuma análise. Até inventaram um nome para isso: brain rot (em português, “podridão cerebral”), eleita a expressão do ano pela Universidade de Oxford, definida como “a suposta deterioração do estado mental ou intelectual de uma pessoa, especialmente vista como resultado do consumo excessivo de conteúdo on-line considerado trivial ou pouco desafiador”.
Assim, pessoas passam horas e horas todo dia, o dia todo, a rolar a tela com olhos ávidos caçando qualquer fato sujeito a receber um julgamento rápido, instantâneo, do tribunal online, formado por milhões de juízes.
“Todo homem tem opiniões, mas poucos são os que pensam.”
George Berkeley (1685-1753), filósofo idealista irlandês cuja principal contribuição foi o avanço de uma teoria que ele chamou de “imaterialismo” (sistema dos filósofos que negam a existência da matéria: o imaterialismo de Berkeley): todo o conhecimento humano é conhecimento de ideias e não de fatos, sendo que tais ideias têm sua origem unicamente nos sentidos e somente podemos ater-nos a elas.
O professor, tarimbado, no meio da aula, de repente pergunta:
— Respondam, sem consultar seu celular: quantas piscinas existem no Brasil?
Silêncio de ouvir pernilongo no corredor, caras aparvalhadas ou de paisagem, uns querendo se esconder dentro da respectiva mochila. Pânico. Que pergunta era aquela? Nenhuma daquelas almas sequer esboçou uma tentativa de raciocínio, elaborou um racional… Não conseguem pensar. Estão acostumados a olhar fatos ou pretensos fatos (99%), não a fazer análises (0%), e a dar opiniões (1%) sobre fatos rasos e mutáveis em questão de horas, sem ter noção sobre o que opinam. Há alguns anos nós tínhamos as revistas semanais que nos abasteciam de informações, nos permitiam conhecer os assuntos, os fatos (70%), para fazermos análises (20%) e darmos opiniões (10%). Hoje essa geração não lê, perdeu a capacidade e o interesse de fazer análises. Vivem em outro mundo, de preguiça mental, de respostas fáceis e prontas.
O professor ainda tentou puxar uma reação, provocar a turma e nada. Ninguém se manifestou, para tristeza e desapontamento do mestre, que decidiu não revelar nem o caminho racional nem o resultado possível. E avisou que colocaria a questão em uma próxima prova, valendo nota. Declarou-se decepcionado com os tenros cérebros embotados.
O educador sabia que a maioria se esqueceria do assunto e apenas alguns, antes de chegar em casa, proporiam para a Inteligência Artificial a questão das piscinas. Entre eles, poucos saberiam formular adequadamente a pergunta de maneira que a IA oferecesse a sua melhor resposta. Sabemos que o determinante para a melhor qualidade da resposta da IA é a qualidade da pergunta feita. Assim, se chegaria a um valor entre 2 e 3 milhões de piscinas no Brasil. Porque é preciso considerar que são cerca de 72 milhões de domicílios no país e 2% das residências urbanas têm o perfil de comportar piscina, o que dá 1,44 milhão de piscinas em residências. Acrescentem-se clubes esportivos e recreativos, várias piscinas, além de 45 mil hotéis e pousadas, assim como áreas de lazer com piscinas em condomínios. Uma estimativa conservadora adicionaria cerca de um milhão de piscinas desses locais.
Aquela noite, depois da aula, o professor voltou para casa pensativo. Mais do que habitualmente. Andava às voltas com pensamentos sobre a Inteligência Artificial versus a Inteligência Natural. Pensou nos seus alunos, jovens, e nos seus clientes, a maioria também jovens. O mercado é “comprador” de jovens. Refletiu, ainda, sobre o papel dos chamados influenciadores, que embora representem um segmento relativamente recente, já está se transformando, pois está saturado – muito influenciador, sem conteúdo, pra pouca marca. Como percebia nitidamente a pouca disposição em geral para pensar nos tempos atuais, uma espécie de síndrome das telas e a facilidade quase instantânea de julgar e sentenciar tudo e todos o tempo todo, começou a entender que despontava entre nós uma figura fundamental, salvadora, o curador, que compreende o todo, tem a visão geral do todo e conhece as partes e sabe recomendar para cada um qual parte é mais adequada, para chegar lá, fazer a diferença. Uma evolução em relação aos influencers.
O professor acordou contente com seus pensamentos e logo cedo, com uma boa caneca de café fumegante em punho, sentou-se para anotá-los no seu caderno de ideias.
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