02 de março de 2021

Investimento social: caminho certo para o relacionamento

A importância da aproximação entre empresas e seus stakeholders

Nas últimas décadas, muito se tem debatido sobre os significados do comportamento socialmente responsável nas empresas, governos e sociedade civil. Se considerarmos ainda os imprevisíveis acontecimentos dos últimos 15 meses, pode-se notar que o assunto “ser socialmente responsável” disseminou-se de tal forma e, em uma velocidade tão grande na mídia e na academia, que hoje é possível identificar uma série de correntes conceituais sobre o assunto.  São argumentos que abordam, desde questões éticas, de legitimidade social e cidadãs que justificam o exercício da responsabilidade social, até as discussões que envolvem as fronteiras limítrofes do papel do Estado e das organizações como principais patrocinadores da ação social nas comunidades.

Para as empresas, o comportamento socialmente responsável pode ser entendido como responsabilidade social corporativa. Elemento que entrou de vez na agenda estratégica das corporações. Esta afirmação pode ser confirmada não apenas pelas inúmeras matérias, artigos, palestras e reportagens sobre o assunto, mas também pelo investimento direcionado: no Brasil foram mais de R$ 6,5 bilhões em doações (monitor de doações) em 2020, o dobro do valor divulgado na última publicação sobre o assunto R$ 3,25 bilhões (censo GIFE 2018).

A responsabilidade social corporativa, como o próprio nome diz, trata-se de como a empresa pode contribuir, em consonância com o seu negócio, para um desenvolvimento mais sustentável do ambiente onde está inserida. Pode parecer clichê, mas o tema não poderia estar mais atual. A responsabilidade social corporativa pode ser vista como a principal conexão entre a empresa e seus diversos stakeholders, ou, se preferir, públicos de relacionamento. Quando uma organização olha não só para um ambiente mais saudável e equilibrado internamente, mas também para seu exterior, sua chance de sucesso e longevidade aumentam consideravelmente. Tanto é verdade que estamos acompanhando declarações e compromissos assumidos por stakeholders relevantes de organizações e governos de ponta. Vimos o executivo chefe da maior gestora de capital privado do mundo dizendo que o “investimento responsável” deve ser o padrão daqui em diante, vimos também o novo presidente da maior potência do planeta colocar, entre seus atos prioritários, a volta de seu país ao Acordo de Paris, o combate à desigualdade, a importância da equidade de gêneros, entre inúmeros outros assuntos.

Podemos ainda nos perguntar: será que esta preocupação é legítima e duradoura? Ao que tudo indica, ela veio para ficar. Em artigo para a revista Valor Setorial (dezembro/2020), Paulo Nassar e Hamilton dos Santos discorrem justamente sobre essa pauta e, dentre as inúmeras reflexões, destacam que “para crescer, as empresas não podem mais apenas buscar o lucro e sim dialogar com todas as pessoas envolvidas na cadeia de valor e adotar as melhores práticas sociais, ambientais e de governança”.

E esse diálogo, pautado por uma atuação responsável, estruturada e de longo prazo, traz benefícios para todos os envolvidos. No entanto, deve ser tratado com a importância que lhe foi atribuída nos últimos tempos, com planejamento, monitoramento e mensuração.

O investimento social como forma de relacionamento se mostra efetivo para os mais diversos públicos.

Para os acionistas, ao que tudo indica, agrega valor. Um exemplo simples contextualiza bem: os relatórios das ações sociais, há alguns anos, eram demonstrados em uma publicação apartada, denominada balanço social. Hoje temos o relato integrado, que traz informações tanto financeiras quando sociais, auditadas por uma empresa externa, o que atesta a veracidade das informações. Para os funcionários, aparece como motivo de orgulho e engajamento, podemos ver com nitidez por meio dos crescentes programas de voluntariado corporativo se multiplicando. Até o início da pandemia, existiam cerca de 7 milhões de brasileiros praticando voluntariado, segundo o IBGE. Para as comunidades do entorno, essa troca e relacionamento fazem a maior diferença. O apoio e subsídio de mais de 570 mil organizações aos projetos culturais, sociais, ambientais, esportivos, dentre inúmeros outros, em suas áreas de atuação em 2020, fizeram diferença na percepção dos brasileiros. Segundo o relatório produzido pelo IDIS, denominado Brasil Giving, nosso povo enxerga que as corporações têm um papel importante a desempenhar nas comunidades: 86% concordam que as empresas brasileiras devem apoiar as comunidades locais e 83% acham que as empresas internacionais devem apoiar as comunidades em que atuam.

Portanto, sejam por questões éticas, de legitimidade social ou de posicionamento perante seus públicos de interesse, nós – os cidadãos –, os governos e as empresas, somos socialmente responsáveis pelo que acontece em nosso entorno. Basta saber o tamanho do impacto a que estamos expostos e como medi-lo, para que possamos gerar valor e fazer a diferença.

Para o mundo empresarial, as oportunidades são infindáveis, desde que as corporações percebam a relevância de incluir em seu planejamento estratégico seus projetos de responsabilidade socioambiental. E que essa inclusão tenha os mesmos pesos e medidas de um planejamento financeiro, ou seja: passe por um período de planejamento, estruturação, tenha aderência aos negócios da empresa e o mais importante, considere o diálogo com os beneficiários. Dessa maneira o investimento social torna-se o caminho certo para o relacionamento com os mais diversos stakeholders.

Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor.

José Maurício Fittipaldi

Executivo com atuação internacional e advogado especialista nas áreas de direito público e regulatório nos setores de mídia, entretenimento, cultura e terceiro setor. É sócio fundador e CEO da Animus e sócio da CQS/FV, escritório jurídico especializado em terceiro setor.

Marina Mattaraia

Mestra em educação, com MBA em gestão estratégica de negócios, pós-graduação em Sustentabilidade pela escola de negócios Fundação Dom Cabral e especialização em Sustentabilidade pela Universidade de Cambridge - Business and Sustainability Programme (BSP). Atuou como executiva de multinacionais durante 20 anos na liderança dos temas ESG – especialmente nos setores de infraestrutura e energia. Foi membro do conselho do FUSSESP – Fundo Social de Solidariedade do Estado de São Paulo e foi indicada como uma das SDG (sustainable development goals) pionners, iniciativa capitaneada pelo Global Compact, área da ONU dedicada ao relacionamento com o universo corporativo.

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