Comunicação e conexão com os talentos no pós-covid
Publicado originalmente no Ideas LLYC, em 6 de agosto.
Em meio às decisões governamentais e de autoridades de saúde para flexibilização das regras de isolamento social, as empresas retornam aos modelos operacionais que adotavam antes da crise, ou antecipam os próximos passos da retomada das atividades dentro de uma nova realidade, enquanto ainda não existem vacinas ou tratamentos eficazes contra o COVID-19.
Segurança e saúde dentro do ambiente corporativo continuam sendo as principais premissas, mas há muitas outras questões em pauta. Redução de receitas e de investimentos, reavaliação das necessidades estruturais reais das empresas, transformação de modelos e do próprio negócio, novos riscos e compliance, reestruturações, desafios operação e de gestão, comunicação e engajamento.
No contexto atual, todas estas variáveis estão redefinindo a maneira como cada empresa enfrenta a crise causada pela pandemia e, em muitos casos, irão consolidar transformações permanentes nos modelos de trabalho. Sondagem realizada em julho pela LLYC com 24 executivos de Recursos Humanos, Talentos ou Gestão de Pessoas de grandes empresas que atuam no Brasil nos setores de infraestrutura, energia, tecnologia, saúde e farmacêutica, além de serviços financeiros e profissionais, traz alguns insights interessantes sobre os desafios para promover o verdadeiro engajamento dos talentos neste ponto crucial para as organizações.
Em meio a incertezas, mudanças de mindsets e dúvidas quanto a uma nova normalidade, as empresas vivem o momento decisivo que chamamos de “turning point”, o ponto de inflexão ou da virada, no qual é preciso estar pronto para os novos cenários que ninguém pode ainda definir de forma assertiva.
Poucas organizações já têm certeza de que voltarão aos seus antigos modelos de trabalho e às antigas estruturas, e mudanças poderão ser necessárias ou bem-vindas em um contexto onde todos buscam retomar receitas, ajustar despesas e reinventar o negócio para fortalecer sua sustentabilidade. Na estreia da nova realidade, os principais desafios são o próprio retorno aos modelos antigos de operação, a adoção dos protocolos corretos de saúde e segurança, saúde mental e equilíbrio entre vida profissional e pessoal, o papel das lideranças, como manter o engajamento individual e entre diferentes times, o foco nas pessoas e o fortalecimento da cultura organizacional.
“Em todos os desafios deste momento crucial, a comunicação exerce papel estratégico e foi uma das maiores dificuldades enfrentadas pelas empresas, com a premissa de que a tecnologia já era fundamental, mas passa a ser priorizada em uma nova escala”
Durante os quase cinco meses do ciclo que incluiu o agravamento da pandemia, aumento das restrições de atividades econômicas e das políticas de isolamento social pelas autoridades, e início da flexibilização e das expectativas em relação a uma nova normalidade, não foram poucas as dificuldades enfrentadas pelas organizações de todos os tamanhos e setores da economia. Entre as maiores barreiras, a queda nas receitas e diminuição dos investimentos nas companhias, além da necessidade de manter o trabalho presencial em atividades consideradas essenciais e os riscos para saúde e segurança das pessoas.
As dificuldades na comunicação aparecem como terceiro obstáculo mais relevante, com melhor avaliação do fluxo entre alta gestão e principais lideranças do que entre diferentes times e equipes. Temas como home office, teletrabalho, adaptações de tecnologias e sistemas, cortes de salários e demissões, que tiveram impactos já superados ou farão parte dos novos cenários a longo prazo, são menos destacados nesta etapa da crise.
Com o aumento da importância estratégica da comunicação interna para as organizações, muitas já vinham desenvolvendo programas estruturados nessa área, mas certamente a pandemia do COVID-19 amplificou a necessidade de manter e fortalecer a conexão entre pessoas e times, e, consequentemente, trouxe um aumento de atividades, informações e ações de engajamento, nem sempre com o investimento de mais recursos financeiros.
A comunicação interna continuará exercendo um papel preponderante nas novas transições que se desenham, mas há percepções a partir da perspectiva de Talentos e Recursos Humanos de que ela precisará se renovar nas formas, conteúdos e abordagens para que possa continuar contribuindo de forma efetiva. Será preciso colocar em primeiro plano as preocupações, inseguranças e riscos reais relacionados à segurança e saúde dos empregados, e mais do que adotar protocolos e procedimentos severos, promover uma comunicação clara, objetiva e contínua, que também responda aos anseios emocionais e práticos individuais, e que portanto faça com que todos se sintam parte de compromissos coletivos.
Há uma necessidade urgente de reinventar formatos, após meses de excesso de videoconferências e lives que pretendiam suprir a sensação de falta de interação e proximidade e a urgência coletiva pelo sentimento de alta produtividade e comprometimento. O uso da tecnologia trouxe mais simplicidade à comunicação interna, tendência que deverá se fortalecer, mas será preciso criar novas ferramentas, espaços de conversação e mecanismos que possam suprir as lacunas relacionais, inclusive em formatos híbridos, nos quais existirá rodízio de funcionários trabalhando nas dependências da empresa para aumentar o distanciamento físico, como medida preventiva
Mais do que canais, conteúdos e eventos produzidos, o foco deve ser nas pessoas, e a visão dos gestores de Recursos Humanos é de que ela deverá apoiar também a saúde mental, o equilíbrio entre vida pessoal e profissional e outros aspectos pessoais dos funcionários, que, no entanto, deverão ser trabalhados também a partir das decisões e pontos de vista individuais. Há percepções convergentes de que o foco no bem-estar passou a ser uma atribuição relevante das organizações, e, também das lideranças, porque impactará diretamente na motivação, na produtividade e nos resultados. E muitos vão além: esse tom de voz e esse foco no bem-estar e nas pessoas irão se manter, mesmo com maior aumento do controle sobre os avanços da pandemia.
“As estratégias de engajamento interno mais bem-sucedidas durante a crise serão as baseadas na escuta das demandas coletivas e individuais e no foco nas pessoas, e ajudarão a consolidar uma cultura corporativa forte e verdadeira”
Considerando uma visão de longo prazo, é importante assinalar os impactos que vão muito além da capacidade de adaptação a novos modelos operacionais, a capacidade de reação e superação de todas as dificuldades, a retomada dentro de uma nova ou da antiga normalidade. As experiências vivenciadas desde o início da pandemia até a busca por saídas para a crise exigirão que a comunicação interna tenha a força necessária para ajudar a manter, fortalecer e disseminar a cultura organizacional, dentro de um contexto novo, incerto e desconhecido para todos. Há preocupações em relação a novos funcionários que foram somados durante a pandemia, a força da comunicação das lideranças em novos formatos de trabalho, a redução das trocas e experiências, a perda do valor dos momentos formais e corporativos, informais e afetivos.
“Os desafios deste momento são manter a proximidade dos times, melhorar o relacionamento entre líder e liderado, entender os melhores pontos de engajamento das equipes, e, no final, colher os frutos de uma cultura corporativa forte e verdadeira”, resume um dos participantes do estudo. Em meio a tantas incertezas, a crise parece também trazer a promessa de que há oportunidades de fortalecimento para os que souberem se adaptar rapidamente às adversidades, ser resilientes aos impactos negativos e velozes na retomada, com uma comunicação efetivamente estratégica, que crie, antes do engajamento, confiança.
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