Assessoria de imprensa e a ética do marceneiro
Todo o jogo tem regras, e, no campo, onde me formei, ser jornalista de veículo era o que importava. Assessor de imprensa era o chapa-branca. Muito provavelmente a época, o cenário, determinasse esses rótulos. Afinal, era o final da década de 80, e muitos dos estudantes da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), no coração do Rio Grande do Sul, eram ativistas da democracia e defensores dos trabalhadores – patrão e empresário eram substantivos quase pecaminosos, contaminados pela mais-valia marxista. Bem dentro desse contexto, aos 18 anos, no penúltimo ano da faculdade de jornalismo, fui apresentada a Cláudio Abramo e ao seu livro de capa vermelha “A Regra do Jogo”, um compilado de artigos e crônicas publicados entre 1948 e 1987, quando morreu aos 64 anos. Se estivesse vivo, em 6 de abril, teria se tornado centenário.
O tempo e o conhecimento têm a generosidade de nos conceder a clareza para ver que as regras do jogo para o jornalista, reconhecidas e respeitadas por Abramo, me guiam hoje na comunicação corporativa, como assessora de imprensa:
“Sou jornalista, mas gosto mesmo é de marcenaria. Gosto de fazer móveis, cadeiras, e minha ética como marceneiro é igual a minha ética como jornalista – não tenho duas. Não existe uma ética específica do jornalista: sua ética é a mesma do cidadão”.
Isso implica atuar com correção, não ser ingênuo ou manipulável. E também não viver dentro do ceticismo ou ser manipulador. Algo como não ter o preconceito de não ter preconceito, como também escreveu o autodidata Abramo.
“Para trabalhar em jornal é preciso fazer um armistício consigo próprio”.
Quantas vezes, em gerenciamento de crise, por exemplo, não temos o papel de advogado criminalista? Ou seja, temos opinião, não somos bobinhos, porém temos o equilíbrio de apresentar os fatos e proporcionar esclarecimentos – que interessam ao cliente, é verdade, só que se deve disponibilizar informações válidas à opinião pública em uma crise de imagem e reputação. É uma questão de sobrevivência para a marca.
“Mas é uma bobagem esperar que o jornalista tenha uma atitude neutra, fria ou álgida diante das coisas”.
Sim, como sempre soubemos, imparcialidade não existe. Todos têm interesses a defender em qualquer uma das esferas humanas. A nossa narrativa, seja em uma crise ou em uma inocente sugestão de pauta, deve ser resultado de observação do repórter e da presença de referências universais – dois dos princípios de uma reportagem, como elencou Abramo. Como jornalista de veículo que fui e agora como jornalista de comunicação corporativa, acredito que o nosso ofício é informar o cidadão a fim de que possa ter mais elementos para tomar suas decisões e viver melhor.
“(…) eu mesmo limitarei minha liberdade. Isso é algo que o jornalista delimita. Não é preciso que o patrão diga. É a regra do jogo.”
Bom senso, maturidade, abertura para o novo e o diferente, ouvir mais do que falar são vitais.
Em um programa de rádio, escutei uma análise de que Maroon5 teria feito uma apresentação cumpridora no The Town – o festival de música que movimentou SP. Ainda mais porque a banda pop norte-americana tocou antes de Bruno Mars, que falou em português e encantou o público. Então, à lista acima, humildemente, acrescento empatia e presença de palco. Temos que encantar os stakeholders – inclusive e principalmente o cliente e os colegas das redações – todos os dias. Talvez, com essa, Cláudio Abramo me fulminaria. A gente até pode sentir medo, só que precisamos enfrentá-lo. É a sobrevivência no jogo.
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