Como “área meio” em empresas dos mais diversos setores e portes, a Comunicação enfrenta, em maior ou menor grau – a depender do estágio de maturidade de seus processos e do nível de consciência dos membros da alta gestão sobre sua importância –, a velha batalha para ser estratégica nas organizações. O debate é lugar-comum entre os profissionais da área. Empenhados em construir um discurso que reflita de maneira coerente o posicionamento da companhia, muitas vezes nos vemos diante da desafiadora missão de equalizar mensagens e estímulos que competem entre si pela atenção de um público, interno ou externo, cada vez mais saturado de informação.
Nosso papel ideal é o da seleção e priorização dos conteúdos. A partir das mensagens-chave estabelecidas para cada um dos públicos de interesse, que ações de comunicação cumprem melhor o objetivo de reforçar a imagem institucional da empresa, fortalecendo os relacionamentos com base em transparência, confiança e propósito? O caminho, que na teoria é óbvio e direto, na prática é cheio de desvios e obstáculos. Num mundo em que a tecnologia transforma todos em comunicadores e a informação se propaga em tempo real, o principal deles é fazer com que todas as áreas da companhia entoem a mesma voz – como numa grande orquestra, em que cada naipe contribui para a construção de uma só melodia. E imagine o resultado se cada um buscasse tocar mais alto que os outros, o tempo inteiro, à revelia das orientações do maestro!
Acredito que estejam completamente superadas quaisquer ilusões a respeito de um suposto controle sobre aquilo que queremos comunicar. A informação circula em todas as direções, todos são emissores e tudo comunica: as peças e ações que elencamos em nossos planos de comunicação, mas, muito antes delas, as decisões da liderança, a antiga “rádio-corredor”, hoje convertida em grupos de WhatsApp, os comentários dos seguidores dos perfis de nossas empresas nas redes sociais e toda a complexa teia de relações humanas envolvida na atuação de dirigentes, colaboradores, fornecedores, parceiros, acionistas, investidores e, em sentido mais amplo, toda a sociedade.
Como consequência, gerenciar a imagem e a reputação de nossas companhias torna-se cada vez mais complexo. É neste sentido que os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) se convertem em oportunidade para fortalecimento do papel estratégico de nossa Comunicação. Não pretendo debater aqui, portanto, aquilo que nós podemos fazer pelos ODS – disseminar, mobilizar, engajar empresas e cidadãos em prol de objetivos comuns. Pretendo debater aquilo que os ODS podem fazer, e já estão fazendo, por nós, profissionais de Comunicação.
O primeiro e mais óbvio resultado desta mobilização em torno de objetivos que congregam um número tão expressivo de empresas é a construção de um propósito comum. Cada companhia tem a oportunidade de enxergar o seu papel no cenário global de transformação social, de definir qual será a sua marca no grande quebra-cabeça em que estamos desenhando um futuro melhor e mais sustentável. Sim, falamos de objetivos básicos, que, numa visão de longo prazo, jamais poderiam estar de fora da agenda de qualquer empresa responsável e cidadã, independentemente de qualquer compromisso formal como a Agenda 2030 e os ODS. Da mesma forma que, ao trazermos o foco para o campo pessoal, todos sabemos as atitudes que devemos cultivar, bem como as que devemos evitar, para assegurar um futuro saudável a nós próprios e ao planeta que deixaremos para as futuras gerações.
Mas sabemos, também, a diferença que a formalização de um compromisso faz. No mundo cada vez mais acelerado e cheio de demandas em que ainda estamos nos habituando a viver, formalizar um compromisso é, literalmente, abrir espaço na agenda para que possamos nos dedicar a ele. Isso mobiliza, dá foco, norte e propósito. Existe melhor matéria-prima para a Comunicação? Alinhados, portanto, a compromissos norteadores e objetivos comuns, temos a nosso favor as justificativas estratégicas para a priorização dos temas a serem abordados, das causas que institucionalmente abraçaremos entre as tantas possíveis. Com isso, podemos ser melhores maestros de nossas vozes institucionais.
O segundo resultado é a formação de fóruns de reflexão e trocas de experiências, que oxigenam nossas práticas e nos tornam mais fortes, abrindo espaço para a avaliação de nossa atuação, para o aprendizado conjunto e a busca de soluções coletivas. É um privilégio ter espaços qualificados como o Pacto Global e sua Rede Brasil, o CEBDS e tantos outros trazendo a comunicação e o engajamento para o centro dos debates. É um privilégio termos um terreno comum de compromissos e propósitos ensejando encontros com profissionais de outras empresas, com experiências e trajetórias tão diversas, mas convivendo com os mesmos desafios que nós.
Por fim, propositalmente, talvez o mais significativo resultado. O compromisso empresarial com os ODS é um exemplo claro, e uma oportunidade de exercício diário, de uma verdade incontestável: não há comunicação efetiva sem alinhamento estratégico. Mobilizar e engajar nossos colaboradores, parceiros, investidores e demais públicos de relacionamento com os compromissos expressos nos ODS só é possível se, de fato, nossas empresas estiverem comprometidas com eles. E isso pressupõe um alinhamento que começa na alta liderança e chega a cada colaborador, expresso na missão, visão e valores da empresa, traduzido nas metas e indicadores – confirmados e atualizados periodicamente – e refletido nas práticas que regem a atuação da empresa e o relacionamento com cada um de seus públicos.
Para todo profissional de Comunicação, portanto, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável são muito mais que uma missão. São, também, uma bem-vinda oportunidade de aprimoramento de nossas práticas, de fortalecimento do nosso papel e de exercício, em conjunto com nossas lideranças, do necessário alinhamento entre discurso e prática, atitude e imagem, visão e ação. Se somos autênticos e coerentes com aquilo que pregamos, nossos propósitos permeiam todo o tecido social de nossas empresas. E isso se reflete em sua voz institucional, que ecoa então clara, transparente e harmonicamente.
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