Publicado originalmente no LinkedIn em 4 de agosto de 2021
A multiplicidade de vozes e a velocidade na propagação da informação são dois dos maiores desafios enfrentados pelos profissionais de Comunicação Corporativa na atualidade. Navegar num cenário de transformações constantes, mantendo o pulso do relacionamento com os stakeholders e assegurando um espaço de relevância para as marcas, é missão que exige flexibilidade, adaptação e criatividade. Um ponto adicional, evidente diante da dinâmica que as redes sociais vêm moldando na sociedade, deu a tônica do encontro de julho do Comitê Aberje de Comunicação e Relações Institucionais, sob o tema “Impacto das Mídias Sociais nas Relações Institucionais”: a necessidade de visitar, conhecer e monitorar “outras bolhas”, superando a tendência de acomodação na confirmação e não apenas valorizando, mas buscando deliberadamente as visões divergentes.
A teia de relacionamentos envolvendo a atuação das empresas é cada vez mais complexa, e a dinâmica das redes sociais amplifica o desafio que é mapear todos os stakeholders e gerenciar o relacionamento de modo a construir valor para todos os envolvidos. Algumas tarefas são velhas conhecidas, conforme destacado no encontro por Carlos Parente, Diretor da Midfield Consulting e Coordenador do Programa Avançado de Relações Institucionais e Governamentais da Aberje: “É preciso estratégia clara, com alinhamento do discurso em todas as frentes de comunicação; colaboração entre as áreas da empresa; integração de narrativas; parceiros; e influenciadores”.
Mas, além da clara metamorfose do termo “influenciadores” nos últimos anos, o relevante papel das redes na arena social impacta esse processo de um modo que exige do profissional de Comunicação consciência clara e atenção constante. Como ressaltou no encontro o Diretor de Inovação da Cortex Intelligence, Cláudio Bruno, “é preciso entender como a marca é impactada pelas bolhas nas redes sociais. Esse monitoramento é essencial para estabelecer estratégias de comunicação”. E entender como as bolhas impactam a marca pressupõe entender, em primeira instância, as próprias bolhas.
É neste ponto que o tema se conecta com as ideias defendidas pelo psicólogo organizacional Adam Grant no livro “Think Again – The Power of Knowing What You Don´t Know”. Com base em pesquisa e estudos de caso, o autor aborda a importância de estarmos abertos ao novo e de assentarmos nossas identidades não mais em “consistência”, mas sim em “flexibilidade”. Questionar as próprias certezas amplia as possibilidades pessoais de aprendizado e crescimento e é caminho, também, para conhecer e entender o novo, o divergente, o contraditório. Exercício essencial num cenário em que os algoritmos direcionam nossa atenção para tudo aquilo que, ao contrário, apenas confirma nossas próprias crenças.
Daí que conhecer a realidade, de fato, em toda a sua amplitude e multiplicidade, exige consciência e esforço deliberado. Como pontua Grant, por hábito somos levados a preferir o conforto das certezas ao desconforto das dúvidas. É demasiadamente humana a tendência de ouvir e acreditar em ideias, pensamentos e opiniões que nos fazem nos sentirmos bem, e não naqueles que nos fazem pensar e nos tiram de nosso sagrado lugar de conforto. Isso fica ainda mais evidente num cenário de extrema polarização como o que vivemos atualmente, em que se tende a dois comportamentos de igual modo limitantes: de um lado, o mergulho constante em contendas que minam tempo e energia, e nas quais pouco ou nada se aprende, porque os envolvidos estão tão aferrados às suas próprias certezas que só fazem reafirmá-las repetidamente (e com agressividade crescente); de outro, o “cancelamento” do divergente, que pode ser ostensivo ou apenas uma decisão interna de não olhar para aquilo/aqueles que nos contrariam.
Quantas vezes nós, profissionais de Comunicação, fomos surpreendidos pelo resultado aquém do esperado de uma campanha ou ação que julgávamos talhada para o sucesso, simplesmente por não conseguirmos enxergar além de nossas próprias convicções? Sim, as pesquisas estão aí para isso, mas não são instantâneas. Sim, estamos aprendendo a navegar na ciência de dados, que oferece não só instantaneidade, mas assertividade também, e que é uma das tendências mais promissoras de nossa área de atuação. Mas é sempre importante lembrar que, por trás dos números, por trás das ferramentas, por trás de toda a tecnologia, estamos nós. E se não nos desafiarmos a vencer nossas limitações e barreiras, a estourar nossas bolhas e visitar o diverso, não conseguiremos evoluir.
Como profissionais de Comunicação vivendo numa era de informação instantânea e polarização extrema, precisamos disso mais do que ninguém. É preciso ir ao encontro do outro. Ouvir, dialogar, encontrar caminhos convergentes e, acima de tudo, defender o espaço para que esse encontro aconteça. Um case da Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (Abia), apresentado pela gerente de Comunicação, Marina Mantovani, traduziu de modo concreto a tônica do debate. Diante do ativismo digital que marcou o processo de aprovação de novo modelo de rotulagem nutricional, em 2018, uma rede formada por 20 associações, representando cerca de 2 mil empresas do setor de alimentos e bebidas, assumiu o protagonismo no debate, informando, propondo alternativas, mobilizando influenciadores e, ao final do processo, reconhecendo o valor do espaço criado para o debate e seguindo na estratégia de conscientização do público.
No caminho dessa, como de tantas outras ações exitosas, foram passos essenciais conhecer os atores envolvidos, entender seus posicionamentos, mapear as divergências e saber o que as motiva. Não existe Comunicação sem diálogo. Se vivemos na era das bolhas, só nos resta aprender a arte de estourá-las.
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