‘A História e a Memória Empresarial nas Organizações no Brasil’: maior pesquisa sobre o tema foi apresentada em live pela Aberje e Memória da Eletricidade
Para 83% das empresas participantes o programa de memória empresarial é uma importante ferramenta de Comunicação
Em parceria com a Memória da Eletricidade, a Aberje conduziu a maior pesquisa feita no Brasil sobre memória empresarial, ‘A História e a Memória Empresarial nas Organizações no Brasil’, e a divulgou durante live transmitida em seu canal do Youtube, no dia 7 de dezembro. Participaram do encontro os diretores da Aberje Paulo Nassar e Hamilton dos Santos, o coordenador da pesquisa Carlos Ramello, consultor responsável pelo Núcleo de Pesquisa da Aberje, o sociólogo Augusto Rodrigues, presidente do Centro da Memória da Eletricidade no Brasil, a museóloga Maria Ignez Mantovani, diretora da Expomus, Juliana Lopes, diretora de Sustentabilidade, Comunicação e Compliance da Amaggi, e a historiadora Ana Paula Goulart, professora da ECO-UFRJ e consultora da Memória da Eletricidade, que mediou o evento.
Na ocasião, Carlos Ramello destacou os principais pontos da pesquisa, que contou com a participação de 117 empresas – 76% nacionais e multinacionais privadas – de 32 setores da economia, em especial do setor de Energia (16% do total). Do total, 62% estão localizadas em São Paulo, com representantes de 12 estados mais Distrito Federal; 57% possuem mais de dois mil funcionários; 55% têm origem de capital no Brasil e 52% delas existem, no mínimo, há 50 anos. O estudo é uma segunda edição revisada e ampliada da pesquisa conduzida pelo professor Paulo Nassar, em 2005.
Uma questão cultural
Um dos pontos destacados na pesquisa é a correlação que há entre o tempo de atividade da organização e a existência ou não de programas de memória empresarial. Apenas 18% dessas empresas contam com programa formais; 50% delas vêm trabalhando a memória empresarial há mais de 15 anos e 40% entre seis e 15 anos.
Ao mediar o encontro, Ana Paula Goulart observou que, das empresas que possuem programas estruturados, a maioria atua no Brasil há mais de 50 anos e são nacionais. “O que isso significa? Esses números parecem indicar uma tendência: a de que empresas nacionais e com maior tradição tendem a valorizar mais o seu passado e a sua história. Se é isso, como podemos pensar o valor e o papel da memória numa empresa mais jovem?”, provocou.
Na visão de Paulo Nassar, o esclarecimento disso não pode ficar atrelado apenas ao tempo de vida das empresas, pois trata-se de uma questão cultural. “Quando se fala sobre memória empresarial há algo que confunde as pessoas. No livro Centro de Memória, as professoras Ana Maria Goulart e Silvana Goulart acentuam que, nesse mundo empresarial existe a ideia de que a memória de uma empresa se restringe ao local onde se guarda coisas antigas – arquivo, biblioteca, museu – algo que remete ao passado, onde se acumula documentos e fotografias”, comentou.
“Temos que pensar o que essas empresas – que possuem programas estruturados e que passaram por inúmeros processos de reestruturação produtiva, inclusive patrimoniais, mudança de métodos produtivos, fusões, cisões e aquisições, além de processos de internacionalização – têm, nessa visão de história, em relação a novas funcionalidades?”, analisou Nassar, explicando que essas ‘novas funcionalidades’ referem-se a processos de gestão do conhecimento, além da questão do compliance (governança ambiental, social e corporativa, além da econômica e cultural) e o accountability (prestação de contas, que é feita não apenas para o acionista, para para um leque que alcança públicos locais e globais.
A geração de memória
Quanto aos objetivos e ações que foram apontados na pesquisa, como em relação à justificativa do negócio para estruturação da memória institucional foram elencados alguns itens: a preservação da identidade corporativa e da coerência institucional (48%); trabalhar a memória como agente catalisador no apoio aos negócios e elemento de coesão entre responsabilidade social e histórica (43%); estímulo ao sentimento de pertencimento dos colaboradores (38%) e transformação da experiência acumulada ao longo da história da organização em conhecimento histórico disponível à sociedade.
A geração de memória também está conectada com a transformação familiar para uma transformação profissional e mostra a evolução de uma organização. Juliana Lopes, que trabalha na Amaggi há 15 anos, conta que o centro de memória da companhia foi formalizado dentro de uma estrutura de memória há cerca de oito anos. “Para que serve a memória? Para que o colaborador possa se conectar com a história da empresa e com o seu processo de transformação. De alguma forma, os desafios do futuro fazem conexão com o passado; pois os valores de uma empresa estão muito calcados em sua própria história e na história de seus fundadores. Em relação à pesquisa, analisando que são empresas brasileiras, surgiram como empresas familiares.
Instrumento de marketing
Outro dado interessante levantado pela pesquisa é que 83% das empresas participantes afirmam acreditar que a memória empresarial é uma ferramenta de marketing e de comunicação da organização. O sociólogo Augusto Rodrigues comentou sobre a percepção diferente que as empresas têm sobre isso. “Percebo que alguma coisa está acontecendo pois as empresas estão dando mais atenção ao tema da marca, da reputação, da imagem, do branding e aí a história organizacional aparece como uma questão absolutamente vital”, salientou
“Creio que no passado estávamos muito preocupados com temas como valores da organização, da coesão, do estímulo ao pertencimento. Hoje, o consumidor está mais preocupado com a origem da organização, com a história da empresa; a pandemia e a quarentena contribuíram para isso. Nós que trabalhamos com isso, estamos impressionados com o aumento da demanda pelos nossos serviços, mas isso talvez tenha a ver com uma experiência necessária exigida pelos clientes neste momento”, analisou.
Há 40 anos no mercado, a museóloga Maria Ignez Mantovani ressaltou a importância de trabalhar a memória em tempo presente e muito mais no plano da comunicação da memória do que no processamento da memória. “Não vejo a memória como algo apenas de celebração do passado. Eu sempre digo que o olhar para o passado deve ser preenchido de futuro, caso contrário é muito difícil desse passado ser útil”, disse.
“O tema é muito estratégico. No mundo de hoje as pessoas estão sendo direcionadas para olhar um pouco para trás, pois a globalização está trazendo muita competição e risco. As pessoas estão com medo do futuro e do presente e tendem a se refugiar no passado. Vejo os clientes preocupados com o passado das organizações e nós temos que fazer uma utilização inteligente disso”, completou Rodrigues.
“As empresas estão preocupadas em externalizarem sua forma de ser, suas origens, seus procedimentos e uma preocupação ainda maior pela reputação, não apenas ao cliente final mas a toda cadeia setorial de valor, incluindo questões governamentais, éticas e sociais”, arrematou Maria Ignez.
Ela destacou ainda que, além da iniciativa privada, as instituições públicas se mostram fortemente preocupadas com a memória de suas instituições. “O poder público também quer se justificar, também quer se alocar socialmente de uma outra forma. Na medida em que a nossa sociedade é invadida por fake news, por uma rede de informações mal cruzadas e não temos um discernimento automático e claro do que é verdade e do que não é, esses fatores com esteio histórico e passíveis de credibilidade passam a ter um papel significativo para a sociedade também”.
Modelos de gestão
A pesquisa revelou também que, das empresas que não possuem uma área formal para o desenvolvimento da memória empresarial – já que o tema é transversal à toda organização -, a área de Comunicação é responsável (71%) por sua gestão e disseminação e em relação ao nível hierárquico da área na estrutura organizacional, 33% dos respondentes afirmaram que o assunto fica a cargo da gerência.
Dessas estruturas, metade trabalha com sua própria equipe – 44% das estimulam suas equipes a participar de seminários e eventos acadêmicos sobre memória, história oral ou outros temas correlatos -; 35% com equipe interna e externa e 15% apenas com fornecedores. 50% desses últimos optam por agências especializadas em memória empresarial.
Para Rodrigues, algumas instituições não têm muito claro a questão da importância da qualificação das equipes de memória. “Esse tema está sendo cuidado por pessoas com muito mais qualificação e isso nos ajuda muito, obviamente, mas cria problemas pois muitas vezes os dirigentes das organizações, principalmente engenheiros e economistas, não têm essa visão tão clara da importância da memória, da história, para a coesão organizacional de um lado e para o apoio aos clientes, do outro lado”, argumentou.
“Em relação a alta gestão, é um processo inicial deles entenderem qual é o papel da memória da organização, mas todo trabalho de memória não se pauta somente pelo resultado junto a alta administração, ele ganha força quando todos os colaboradores entendem o papel da memória, quando eles fazem essa conexão entre o passado e o futuro: que quanto mais eu conheço a minha história, mais eu crio o meu futuro”, complementou Juliana.
Origem dos materiais e recursos
Quanto à origem dos materiais coletados, 66% vem dos acervos institucionais, 31% de acervos pessoais e 3% vem de outras fontes. São fotografias, documentos, depoimentos, publicações e vídeos (100%); medalhas, troféus e objetos antigos (95%). Entres os principais produtos/ações desenvolvidas no âmbito desse programa estão exposições (79%), site institucional (63%), livros e vídeos (58%), eventos (42%) e museus fixos/itinerantes (32%), além de intranet, sites, revistas e redes sociais.
Em relação aos recursos necessários para montar um centro de memória empresarial, 94% das empresas informam que o orçamento vem de dotação da própria empresa, 11% conta com verba governamental, 6% vem por meio de cobranças por serviços prestados e 61% das empresas preferiram não informar o valor anual de investimento nesse tipo de programa. Dos que informaram, o valor médio gira em torno de R$ 240 mil por ano. Entre as principais barreiras ou desafios da área de memória empresarial estão a falta de recursos tecnológicos, financeiros ou de espaço (28%) e a falta de recursos humanos (33%).
Assista à live na íntegra:
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