Comunicação, relações públicas e comportamento
O etos da comunicação e das relações públicas é produzido nas crises empresariais e institucionais. Um parto que necessariamente não revela de imediato para a sociedade e interessados o que empresários e políticos pensam, fazem e pretendem diante de acidentes ambientais, vazamentos de documentos, problemas com produtos, entre outras situações noticiadas pelas mídias tradicionais ou sociais. Na maioria das vezes, ficamos sabendo quem eles são muito tempo depois. Empresas e governos que não transformam erros em propaganda positiva destroem ações de comunicação e transformam relações públicas em relações não-públicas devem ser louvados.
Como comunicação e relações públicas ainda são comandadas por pessoas, falamos também no etos dos profissionais, produzido no calor dos fatos controversos, de crise, momentos em se escolhe entre as éticas da comunidade e as dos poderes. É o mesmo dilema narrado na tragédia Antígona, de Sófocles, cujo personagem retrata o amor, a compaixão, a lealdade, a amizade, a humanidade como elementos mais fortes do que as leis do Estado. No drama, Antígona enterra o irmão, Polinice, apesar de a lei impedir esse ritual sagrado para quem tivesse contestado as leis da cidade de Tebas. E quantas vezes deparamos com situações em que as leis da empresa e do Estado são antagônicas ao sagrado, às boas tradições e à cidadania? Existem sábios de relações públicas e comunicação que vivem dentro de teorias e conceitos e são incapazes de se posicionar sobre os temas e os problemas de nosso tempo, de nosso país, de sua gente e de suas ruas. O Brasil está fora de suas disciplinas.
Os maus exemplos
Fonte de maus exemplos são os estudos de caso que focalizam a comunicação que se dá à revelia do controle que as centrais de relações não-públicas tentam impingir, como o caso ainda a ser estudado da British Petroleum (BP), que amargou um prejuízo trimestral de US$ 17 bilhões em razão do vazamento de petróleo no Golfo do México e demitiu Tony Hayward, presidente da petrolífera inglesa, tido como o grande responsável pelo maior desastre ecológico acontecido nos Estados Unidos. O seu descomprometimento com a gerência do problema ficou patente com uma frase não-administrada pelos manuais de comunicação de crise: ‘Quero a minha vida de volta (I want my life back)’, expressão da sua insensibilidade com a dimensão do problema. Ou ainda, o vazamento de 97.731 documentos secretos da guerra do Afeganistão, produzidos entre 2004 e 2009, que revelou crimes de guerra contra inocentes, crianças e mulheres, além de estratégias e ações mal-sucedidas. A atuação do jornalismo investigativo do site Wikileaks, aliada à divulgação conjunta no Guardian, New York Times e Der Spiegel aniquilou as ações de propaganda e relações não-públicas, que manipularam a realidade de uma guerra cada dia mais antipática para a opinião pública norte-americana e ocidental.
Em meio aos questionamentos de toda a mídia, o relações-públicas da Casa Branca, Robert Gibbs, afirmou o etos governamental, que desrespeita a comunicação e as relações públicas democráticas. Sua frase, que entrou para a coleção de retóricas que sustentou inúmeras ditaduras na América Latina e a deposição de governos eleitos democraticamente, como o de Salvador Allende, no Chile, foi a que afirmou ‘não existir nada nos documentos que já não tenha sido debatido pela sociedade’.
No Brasil, em época de eleição, é bom relembrar as tiradas de políticos, ficha limpa ou não, indiferentes às crises ocorridas no oceano, na terra e no ar, aqui e além-mar. Não se brinca impunemente com passageiros estressados em aeroportos, com direitos humanos, com a memória de famílias de presos políticos.
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