Aberje desenvolve ações no combate à infodemia
Checagem incessante, ética profissional, protocolos de apuração e educação midiática são as armas na guerra contra a desinformação, evidenciada pela pandemia
A pandemia do coronavírus vem evidenciando muitos fenômenos. Um deles é a infodemia, termo batizado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como uma superabundância de informações. Essa invasão de conteúdos falsos e duvidosos na internet gera insegurança e ansiedade afetando a saúde da população, enfraquece a democracia e impõe desafios inéditos à Comunicação Corporativa.
Na guerra da desinformação, a melhor forma de se proteger é priorizar a qualidade da informação, a partir de fontes idôneas e confiáveis. Recorrente, o debate sobre a disseminação de fake news – informações falsas expostas em forma de jornalismo com a intenção de interferir na opinião pública – ganhou maiores proporções com a velocidade dos impactos negativos que circulam nas redes sociais.
De acordo com a pesquisa da Aberje Fake News: Desafios das Organizações feita em 2018, 91% dos empresários entrevistados já temiam os potenciais danos que as notícias falsas podem causar à reputação da sua marca; e 40% manifestaram preocupação com perdas financeiras além de dano à credibilidade e reputação da empresa.
A ‘batalha’ pela veracidade da informação
Durante uma das quatro sessões do Fórum de Comunicação Corporativa 2020, promovido pela Aberje em parceria com o jornal Valor Econômico, o diretor de Comunicação e Sustentabilidade do Grupo CCR, Tonico Pereira, comentou que as redes sociais têm feito um grande mal depois do grande bem que fizeram. “A imbecilidade precisa ser combatida com informação, checagem e serenidade. A comunicação é um ativo valiosíssimo, mas tem que ter sinergia e bom senso, que deve ser proativo e não reativo”, argumentou.
Assim como esse tradicional fórum de discussão entre especialistas, acadêmicos e profissionais de comunicação, foram realizadas diversas atividades ao longo de 2020, a fim de fomentar o debate sobre questões que envolvem a Comunicação Empresarial, como a infodemia.
O tema das fake news e da desinformação esteve presente em várias atividades organizadas pela Aberje e por parceiros associados ao longo de 2020. Em abril, a entidade fechou uma parceria com a AFP – Agence France-Presse, agência global de notícias que conta com uma estrutura dedicada à checagem de notícias, a fim de municiar os associados e profissionais de comunicação com informação confiável. Além disso, foram dezenas de webinars e lives gratuitas transmitidas via canal da associação no Youtube; notícias no portal da associação e nas redes sociais abertas, como Linkedin, Facebook, Instagram, Youtube e Twitter; vídeos semanais com professores da Escola Aberje de Comunicação; episódios do podcast FalAção da Aberje, disponível em várias plataformas; edições da Aberje Thinks – emails enviados aos associados contendo pesquisas, e-books, súmulas informativas e estudos do mercado aos associados.
Infodemia também é assunto da matéria de capa da mais recente edição da Revista CE – Comunicação Empresarial, publicada semestralmente pela Aberje. Na reportagem, especialistas debatem o impacto da atual Era da Desinformação para as organizações e o papel das marcas em um contexto em que notícias falsas trazem riscos para a democracia e para os negócios. A edição também traz uma entrevista com Adam Ellick, diretor do Departamento de Vídeos de Opinião do The New York Times, que dirigiu em 2018 a série Operation InfeKtion, trabalho fundamental para quem quer entender a origem da guerra de desinformação.
O Whatsapp é outro ambiente que promove interações diárias sobre variados assuntos entre mais de dois mil profissionais associados, através de 14 grupos mantidos pela Aberje nos estados brasileiros. Entre os materiais compartilhados estão: o manual de jornalismo Fake News & Desinformation, da Unesco; o e-book Fake News da Intervozes e Big Data e Fake News na sociedade do (des)conhecimento, da Justiça Eleitoral e as cartilhas Entenda a Infodemia e a Desinformação na Luta contra a Covid-19, da OMS e Todos contra as Fake News, da Câmara Municipal de São Paulo.
O poder da notícia e o apelo das fake news
O filósofo Alain de Botton traz em seu livro The News: a user’s manual (2014) uma frase que seu colega Friedrich Hegel já dizia lá no início do século XIX: “as sociedades tornam-se modernas quando as notícias substituem a religião como nossa fonte central de orientação e nossa pedra de toque de autoridade”. Quem explica é o jornalista e instrutor da Aberje, Luiz Chinan: “essa ‘força moral’ da notícia, chamada por alguns de ‘quarto poder’, acabou por criar a sua contraparte: as fake news, ou seja, a arte de forjar, manipular e enviesar informações com o objetivo de promover agendas específicas. Na prática, são campanhas de propaganda disfarçadas de jornalismo”.
Informações distorcidas e mentirosas, que infestam as redes sociais através de campanhas para manipular a opinião pública, são criadas por um mercado já consolidado, mas quem as propaga é o cidadão comum. Estudo realizado pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts – MIT (EUA) e publicado na Revista Science, aponta que as fake news têm probabilidade 70% maior de serem compartilhadas do que informações verdadeiras. “Pelo sensacionalismo, o apelo dessas notícias acaba adquirindo um poder de disseminação muito grande, o que torna o post extremamente tóxico”, salienta o professor e consultor em comunicação com foco em gestão de crises José João Forni, que ministra o curso livre Gestão de Riscos e Crises Corporativas da Aberje.
Pesquisa da Edelman Trust Barometer feita em meados de 2020 em que, num universo de cerca de 30 mil pessoas, 40% se informavam exclusivamente por redes sociais. “Isso vem mudando justamente por causa da pandemia. É tanta informação falsa, não comprovada, distorcida que as pessoas passaram a não confiar na assertividade das publicações das redes sociais”, avalia o professor.
Antes chamadas simplesmente de boatos, fofocas ou calúnias, as fake news hoje se espalham descontroladamente devido à hiper conectividade. “Por isso grupos se aproveitam do crescente analfabetismo científico, histórico e político e potencializam um ambiente de ilusão, em que a desinformação descontrolada virou uma poderosa arma, um instrumento ideológico com alcance até no cenário geopolítico, investindo na ignorância como terreno fértil para minar as conquistas iluministas e democráticas da humanidade”, analisa Maurício Pontes, CEO da C5i Crisis Management Consulting e um dos professores do curso de pós-graduação da Aberje.
O especialista em Gestão de Crises compara a infodemia a uma doença de alto contágio e potencial de dano. “Ela mina o pensamento crítico, a sensatez, destrói reputações de pessoas e instituições e ameaça o futuro de uma sociedade que precisa das fontes formais e reguladas, em que o jornalismo profissional é o ator fundamental com suas checagens e evidências”, salienta.
Em suas aulas do MBA em Gestão da Comunicação Empresarial, Pontes conta que vem tratando desse tema há muito tempo e em distintos contextos. “Costumo abordar os riscos das redes e plataformas de mensagens como armadilhas catalisadoras de crises. Conteúdos falsos compartilhados indiscriminadamente podem induzir decisões catastróficas se aceitos em ambientes de pressão no gerenciamento de crises. Também recorro à lógica, psicologia, método científico e a teoria da complexidade para discutir porque fatos incontroversos como a conquista da Lua e a importância das vacinas são negados e hipóteses absurdas são bem aceitas, sem questionamento”, argumentou.
Comunicação: ativo importante para as empresas
“A comunicação é um ativo importante para as organizações. Quem trabalha na área tem o dever de fazer uma comunicação proativa e evitar repercutir qualquer informação, antes de ser comprovada por meio das mídias tradicionais ou de fontes confiáveis. Dessa forma, nenhuma informação se fragiliza”, recomenda o professor João José Forni.
Incontáveis são as crises empresariais, os prejuízos financeiros e os danos morais ocasionados por notícias falsas e informações equivocadas. Hoje, as organizações produzem, disseminam e compartilham notícias o tempo todo. “Somos todos produtores de conteúdo. Muitas vezes os colaboradores das empresas são percebidos, nas redes sociais, como representantes das marcas. Por isso, mais do que nunca, cada profissional de uma empresa precisará assumir a responsabilidade por disseminar apenas informações confiáveis”, salienta Mônica Chaves que, juntamente com Marlene Duarte, ministra o curso O que sua marca pode fazer para combater a desinformação, da Aberje.
“A desinformação é um dos fenômenos que mais preocupa a sociedade, especialmente em tempos de pandemia. Isso se reflete também na relação dos consumidores com as empresas. Marcas são cobradas a se posicionar e até mesmo a cortar patrocínios dados a veículos de baixa credibilidade. Nesse contexto, os profissionais vão precisar, cada vez mais, se capacitar para identificar informações confiáveis”, complementa Marlene.
Essa credibilidade surge quando há compromisso com a verdade, por isso a responsabilidade de apurar a veracidade das informações antes de repassá-las ou entendê-las como verdadeiras é de todos. Trata-se da ‘higiene de informação’, ou seja, quando há verificação de dados ou se evita o repasse de informações sem que as mesmas sejam checadas. De acordo com a edição deste ano da pesquisa Edelman Trust Barometer, apenas um quarto dos entrevistados (26%) a praticam.
Luiz Chinan ressalta que as empresas não podem se eximir dessa tarefa, sob pena delas próprias já serem vítimas de fake news. “Aquelas letrinhas tão na moda hoje entre os executivos, o ESG (Governança ambiental, Social e Corporativa), precisam de mais uma: a letra N, de News. Não há como negar que todos devemos estar unidos em torno da responsabilidade noticiosa”, recomenda.
“As empresas informativas precisam assumir a sua responsabilidade, ampliando a checabilidade dos fatos que noticia e a sociedade deve entender que o fenômeno das fake news é mais um problema de letramento midiático do que de tecnologia. Tal qual ler, escrever e calcular, os cidadãos precisam também aprender a se informarem e a informar adequadamente”, complementa o professor do curso Engajamento com Jornalistas: como Transformar a Imprensa e os Blogs em Aliados da Estratégia Organizacional.
A ética profissional e a educação midiática são os únicos caminhos para interromper o ciclo da difusão desse tipo de notícia, que representa risco à democracia. Na análise de Pollyana Ferrari, doutora em Comunicação pela USP, autora de nove livros sobre Comunicação Digital, professora da PUC-SP e instrutora da Escola Aberje de Comunicação, as sociedades democráticas não relativizam os fatos.
“Checar informações antes de compartilhar deve ser um hábito de todos, bem como acredito que a educação, voltada para análise crítica das informações deve começar nos currículos do ensino fundamental, aos nove anos, e percorrer todas as fases da escolarização. Só com educação teremos um combate efetivo contra à desinformação”, frisa.
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