Como Sobreviver a Conversas Desconfortáveis
Você há de concordar comigo que vivemos não somente a era de livre expressão, mas também da livre interpretação. Zachary R. Wood sentiu isso na pele. Ao convidar figuras polêmicas para palestrar na sua universidade, virou alvo de ataques ferozes até das pessoas que conheciam seus valores e sua história. Nem sob pressão, ele abriu mão de um propósito extremamente significativo para os dias de hoje: compreender ambientes e pessoas diferentes para aprender a se comunicar e a conviver com mindsets e comportamentos divergentes.
Com menos de 30 anos, o jovem editor assistente do The Guardian já publicou pela Penguin Random House um livro de memórias, em que conta como foi crescer na “intersecção da América negra e branca”. Estudante bolsista de escolas de elite, frequentada majoritariamente por brancos nascidos em condições socioeconômicas completamente opostas à sua, Wood ganhou notoriedade nos Estados Unidos com as polêmicas que criou na prestigiada Williams College.
Como líder de um clube voltado à liberdade de expressão, ele convidou defensores da supremacia branca e anti-feminismo para expor suas ideias no campus. “Era importante para mim demonstrar que o Unconfortable Learning [Aprendizagem Desconfortável, em tradução literal, era o nome da iniciativa que liderava] era mais do que ganhar uma discussão; era também entender o que importava para as outras pessoas e por quê”, explicou em seu livro, no qual revela as origens da empatia ou da vontade de entender o outro.
Bipolar e esquizofrênica, a mãe de Wood foi sua vilã e heroína. Ao mesmo tempo em que, durante os surtos, abusava emocionalmente do filho, também foi sua grande coach no desenvolvimento das competências emocionais necessárias para não se sentir menosprezado ou subestimado por ninguém. Além de ensiná-lo a não se intimidar com poder social e econômico, ajudou-o a “ler” as pessoas. “A verdade é que agimos como se a razão controlasse o mundo, quando, na verdade, a maior parte de nossas vidas é governada por instintos, impulsos e desejos que tentamos suprimir”.
Ao tentar entender a origem e os valores dos outros, é possível compreender a lógica por trás das escolhas ou ideologia, fundamentar melhor argumentos e transformar discussões acaloradas em um diálogo de alto nível. Para navegar por essas conversas desconfortáveis, tão presentes nos corredores das empresas e nas redes sociais, a receita de Wood é simples:
- Entenda o motivo pelo qual o assunto controverso causa emoções tão fortes em você. Identifique preconceitos, impulsos e tendências que o fazem discordar da outra pessoa. Palavra-chave: autoconhecimento.
- Familiarize-se com pontos de vista diferentes do seu. Para isso, deixe suas certezas de lado e mergulhe no outro universo – estude e encontre interlocutores dispostos a responder questões bem formuladas. Palavra-chave: Escuta.
- Reflita sobre a interação e o que ressoou positiva e negativamente em você. Abra-se para outros vieses ou descubra maneiras de defender mais veementemente sua posição. O ponto não é ter razão, mas se engajar e aprender com a situação. Palavra-chave: Conhecimento.
Wood ressalta, enfim, que aprender a lidar com conversas desconfortáveis é fundamental para gerar inclusão. Esta palavra está na moda e, para se tornar realidade, não basta um movimento ou ação coletiva; é preciso um esforço individual. Assim, esse período de discussões morais e políticas efervescentes semeia desenvolvimento, e não retrocesso.
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