26 de abril de 2017

“O candidato é bom, mas é muito gay”

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Quem trabalha com recrutamento e seleção talvez já tenha se deparado com a frase acima em algum momento da carreira. Ela é mais comum do que se imagina.

Pesquisa da Elancers realizada com dez mil empresas revelou que uma em cada cinco organizações não contratariam homossexuais. 7% dos recrutadores não dariam chance a estes profissionais em hipótese alguma e outros 11% os recusariam para funções que representem a empresa publicamente – o que pode incluir do operador de call center ao CEO.

Os números são bastante ilustrativos da homofobia que persiste no Brasil e demonstram a necessidade de avançarmos nas discussões sobre diversidade no trabalho.

Antes que alguém diga que sexualidade é um assunto privado e nada tem a ver com empresas, retruco: praticamente não existe mais divisão entre pessoal e profissional.

As pessoas querem se levar inteiras para o trabalho, sem se preocupar em necessariamente sair da sala para atender uma ligação do companheiro, sem precisar trocar o pronome, chamando “ela” de “ele” a todo momento ou fugir das conversas sobre o fim de semana, tão comum no retorno de feriados prolongados.

Imagine o estresse a que é submetido um profissional que passa por essas situações? É possível ser produtivo e engajado quando se vive com medo de ser “descoberto” e, eventualmente, ver sua carreira comprometida apenas por conta de sua orientação sexual?

Dizer “não” a gays e lésbicas é fechar as portas a um ambiente mais inclusivo, criativo e inovador. Todas essas características emergem quando as diferenças – todas elas – são valorizadas e bem recebidas nas organizações.

Precisamos apostar no diálogo e na empatia como formas de avançarmos neste assunto. É a partir da troca de experiências e da disposição para o entendimento que conseguimos vencer preconceitos, conscientes ou não.

É importante ressaltar que gays e lésbicas não querem privilégios. O que reivindicam é apenas aquilo que já é garantido aos seus pares heterossexuais: oportunidades iguais e respeito.

Não é porque um grupo ganha direitos que outro vai perdê-los. Não é assim que funciona. É possível expandir a noção de cidadania e incluir mais pessoas sem prejuízo daqueles que já são contemplados ou exercem posições de prestígio na sociedade ou no mercado de trabalho.

Heterossexuais, inclusive, têm um papel fundamental nesta jornada. A atuação deles como aliados é importante para espalhar a mensagem do respeito, coibir “piadas” ou manifestações de preconceito e convencer mais colegas da importância do assunto.

Estimule as conversas sobre diversidade na sua empresa. Reúna pessoas sensibilizadas para o assunto para discutir as especificidades de ser mulher, negro, pessoa com deficiência, jovem, velho ou LGBT na sua organização.

Vocês podem refletir sobre a situação atual, identificar eventuais problemas, envolver a liderança e, juntos, traçarem um planejamento para garantir um ambiente seguro e acolhedor para todas as pessoas.

Um mundo mais igualitário e respeitoso pode ser construído a partir de nossas baias e salas de reuniões. Ganham a empresa, a sociedade e os funcionários, todos eles, não apenas os gays e lésbicas.

PS: A questão das pessoas trans, ainda mais complexa, será tratada em outros artigos sobre diversidade e trabalho.

Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor.

Ricardo Sales

Ricardo Sales é consultor de diversidade, pesquisador e conselheiro consultivo. É formado pela USP, onde também realizou mestrado sobre diversidade mas organizações. Atua para algumas das maiores empresas do país. É conselheiro do Comitê de Diversidade do Itaú. Foi eleito pela Out&Equal um dos brasileiros mais influentes no assunto diversidade nas organizações e ganhou o Prêmio Aberje de Comunicação, em 2019. Foi bolsista do Departamento de Estado do Governo dos EUA e da Human Rights Campaign, sendo reconhecido como uma liderança mundial no tema diversidade. É também palestrante, professor da Fundação Dom Cabral e da Escola Aberje de Comunicação, colunista da revista Você SA e do Estadão, além de membro-fundador do grupo de estudos em diversidade e interculturalidade da ECA/USP.

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