21 de janeiro de 2025

As sutilezas no ofício da comunicação, para não ofuscar o Rei Sol

Quando ganhamos estes pequenos aparelhos como extensões fixas dos nossos braços, parece que veio junto um desejo quase insano de receber likes, reconhecimento, validação, engajamento. Então, dá-lhe mensagens, postagens, comentários, “textões”, lives, tudo junto e mais um pouco. Afinal, o que vale são as aparências neste mundo de superexibição e as diversas redes sociais, que nos enredam os egos e nas quais aparecer e parecer é mais importante do que ser, existem para fazer isto. Pode parecer uma contradição na sociedade atual, mas não é. A sociedade contemporânea é movida pela instantaneidade das coisas, pelo consumo rápido, pelo descartável. É um dilema aparentemente simples, porém, difícil de equilibrar.

Cuidado. Não se engane: o preço pode ser alto. Ainda há um limite tênue a ser respeitado pelos profissionais dentro das organizações e, muitas vezes, brilhar em excesso, quase que todo dia, toda semana, pode condenar você ao olho da rua. São muito tortuosos os caminhos da vaidade humana, inclusive a sua, e você deve ter total controle sobre ela no seu trabalho (um exercício diário). Sei de pelo menos meia dúzia de casos, de pessoas conhecidas, que perderam bons empregos em organizações importantes porque cederam demasiadamente às vaidades pessoais, esforçaram-se para aparecer mais do que a marca e do que próprio chefe e perderam sustentação, digo, o emprego. E o pior, já não eram jovens profissionais ainda deslumbrados com os holofotes da carreira, e tiveram que enfrentar, além da derrota, o etarismo do mercado cruel. Mesmo com prêmios ou reconhecimentos na mão.

Por isso, pense na figura da “eminência parda”, que nunca saiu de moda, mesmo que talvez você não a conheça. Eminência parda é uma expressão que se refere a uma pessoa que exerce o poder de forma discreta, sem ocupar uma posição pública de destaque. A expressão descreve perfeitamente o que deve ser um bom profissional de comunicação, RIG etc. de uma empresa: deve ser um assessor poderoso que atua de forma low profile, exerce o poder sem ser o governante supremo, resolve a bem dos interesses da organização que representa, sempre com ética e transparência. Ou seja, sua característica é a discrição no trabalho feito nas interfaces diárias. Ponto. Não precisa estar na hora da fotografia, não tem que ter a necessidade pessoal de ego, de autoafirmação.

A expressão surgiu a partir da influência de François Leclerc du Tremblay (1577-1638), conhecido como “O Padre José”, que era a eminência parda, um frade capuchinho que era o “braço direito” do cardeal Richelieu (1585-1642), primeiro-ministro (1624) que, em pouco tempo, tornou-se senhor absoluto da França.

Olhando um clássico “manual das artes da dissimulação”, um livro muito lido pelos executivos de empresas no mundo todo, “As 48 Leis do Poder”, de Robert Greene, de 1998, com mais de 1,2 milhão de exemplares vendidos em 24 línguas, cujos textos abarcam um período de mais de três mil anos e foram pinçados em civilizações tão diferentes quanto a antiga China e a Itália renascentista, temos lá, como a Primeira Lei: “Não ofusque o brilho do mestre”.

Nele, o autor conta que Nicolas Fouquet, ministro das Finanças de Luís XIV nos primeiros anos do seu reinado, era um homem generoso que gostava de festas pródigas, mulheres bonitas e poesia. Gostava também de dinheiro, era inteligente e indispensável para o rei. Quando o primeiro-ministro da época, Jules Mazarin, morreu em 1661, o ministro das Finanças esperava ser nomeado seu sucessor. Mas o rei decidiu abolir esse posto. Esse e outros sinais levaram Fouquet a desconfiar que estava perdendo prestígio, e ele então decidiu agradar ao rei organizando a festa mais espetacular jamais vista no mundo.

Aparentemente, a festa era para comemorar o término da construção do castelo de Fouquet, Vaux-le-Vicomte, mas a sua verdadeira finalidade era prestar uma homenagem ao rei, convidado de honra. A nobreza mais ilustre da Europa e alguns dos grandes intelectuais da época – La Fontaine, La Rochefoucauld, Madame de Sévigné – estavam presentes. Molière escreveu uma peça para a ocasião, na qual ele mesmo deveria representar no encerramento da noite.

A festa entrou pela noite adentro e todos concordaram que nunca tinham visto nada mais espantoso. No dia seguinte, Fouquet foi preso pelo chefe dos mosqueteiros do rei, D’Artagnan. Três meses depois foi a julgamento sob a acusação de ter roubado o tesouro do país. Fouquet foi considerado culpado e enviado para a prisão mais isolada da França, no alto dos Pirineus, onde passou os últimos vinte anos da sua vida na solitária.

Ainda de acordo com a obra de Greene, Luís XIV, o Rei Sol, era um homem orgulhoso e arrogante que desejava ser o centro das atenções sempre; não suportava ser superado em prodigalidade por ninguém, e certamente não por seu ministro das Finanças. Para o lugar de Fouquet, Luís escolheu Jean-Baptiste Colbert, um homem famoso por sua parcimônia e por promover as festas mais insípidas de Paris. Colbert garantiu que todo o dinheiro liberado do tesouro fosse parar direto nas mãos de Luís. Com o dinheiro, Luís construiu um palácio ainda mais magnífico do que o de Fouquet – o glorioso Palácio de Versalhes. Ele usou os mesmos arquitetos, decoradores e paisagistas. E em Versalhes Luís deu festas ainda mais extravagantes do que aquela que custou a Fouquet a sua liberdade.

Portanto, Lei número 1:

Pode até ser um certo exagero, mas “Faça sempre com que as pessoas acima de você se sintam confortavelmente superiores. Querendo agradar ou impressionar, não exagere exibindo seus próprios talentos ou poderá conseguir o contrário – inspirar medo e insegurança. Faça com que seus mestres pareçam mais brilhantes do que são na realidade e você alcançará o ápice do poder”.

Assim, se você entrou no redemoinho de se mostrar excessivamente nas redes, que oferecem um falso luminoso para as pessoas posarem embaixo muitas vezes com cara de inteligentes, recomendo que reveja rapidamente seus valores e atitudes. Você é profissional de comunicação a serviço de uma marca, uma causa, um determinado objetivo, o que é quase um sacerdócio e não uma manifestação unicamente do seu ego. Ou seja, se você aparece na fotografia mais do que sua liderança, acredite, alguma coisa está muito errada. Luz amarela piscando e nem sempre percebermos.

Sei que não é fácil, muitas vezes é até uma luta diária, mas o reconhecimento e a recompensa profissional que todos nós normalmente almejamos deve vir inicialmente de dentro da organização, não do mercado. Certa vez, ouvi de um executivo (presidente de uma grande organização) que admirava muito: “o mercado até promove, mas é a empresa quem demite!”. Por isso, entenda os mecanismos de reconhecimento da sua empresa e busque-o alcançar com equilíbrio na sua exposição e, preferencialmente, discrição.

Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor.

Carlos Parente

Graduado em Administração de Empresas pela UFBA, com MBA em Marketing pela FEA USP, possui um sólido histórico de experiência em Relações Institucionais & Governamentais, Comunicação Corporativa e Advocacy, com participações e lideranças em processos de comunicação estratégica, inclusive internacionais. Carlos Parente é sócio-diretor da Midfield Consulting.

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