28 de junho de 2024

Ética em xeque

Publicado originalmente no LinkedIn, em 28 de junho de 2024

Os recentes eventos envolvendo a Americanas e o pedido de prisão de seus ex-executivos lançam uma sombra pesada sobre o mundo corporativo, reacendendo o debate da ética nos negócios. A fraude choca o país em todos os significados da palavra “valor” e serve como um alerta sobre os perigos de uma cultura empresarial na qual profissionais de caráter duvidoso ainda encontram espaço para suas aventuras pessoais.

Infelizmente, essa não é uma situação isolada. Nas últimas décadas testemunhamos diversos casos de obtenção de vantagens pelo ilícito, originadas em distintas organizações, no Brasil e no exterior. Ao longo de minha carreira vi executivos saindo escoltados pela PF, outros proibidos de entrar na empresa, tendo recebido voz de prisão na chegada ao trabalho; colaboradores formando quadrilhas internas para a execução de fraudes, uma delas, inclusive, chegou a ser identificada como braço operacional de uma conhecida organização criminosa do País.

Esses casos evidenciam um padrão preocupante: a corrosão ética que se infiltra em diferentes níveis hierárquicos e setores da economia. A busca desenfreada por resultados a qualquer custo, a cultura do “jeitinho” e a ambição pessoal criam um terreno fértil para desvios de conduta. A falta de transparência, a conivência com práticas questionáveis e a ausência de mecanismos de controle efetivos perpetuam um ciclo vicioso que coloca em risco a reputação das empresas.

Mas como reverter esse cenário? A resposta, embora complexa, passa por uma mudança profunda de valores. É urgente resgatar a ética como pilar fundamental da cultura empresarial, e isso exige um esforço conjunto. A educação, tanto no âmbito familiar quanto escolar, desempenha um papel elementar na formação de indivíduos íntegros e conscientes. É preciso cultivar desde cedo valores como honestidade, responsabilidade, respeito e justiça. A ética precisa ser mais do que um conjunto de regras, deve ser um compromisso genuíno com a retidão e a justiça.

As empresas, por sua vez, devem ir além da simples busca por profissionais competentes ou que geram resultados. Inúmeras vezes vi executivos tóxicos e de atitudes pouco ortodoxas serem “perdoados” porque apresentavam resultados financeiros, na maior parte das vezes às custas de uma equipe destruída. É preciso priorizar a contratação de pessoas de bom caráter, que demonstrem integridade, ética e respeito em todas as suas relações.

A criação de códigos de conduta rigorosos, a implementação de canais de denúncia seguros e a valorização de uma cultura de compliance são medidas essenciais para criar um ambiente corporativo mais ético e transparente. Isso beneficia toda uma equipe interna, mas fortalece sobretudo a segurança para que qualquer pessoa possa comprar a ação de uma empresa ou adquirir os seus produtos.

É preciso romper com a lógica perversa de que os fins justificam os meios. O sucesso conquistado por meio de fraudes, corrupção e desrespeito é uma vitória ilusória, com consequências devastadoras a longo prazo. É preciso resgatar a crença de que a ética não é um obstáculo ao sucesso, mas o caminho mais sólido e sustentável para alcançá-lo.

É triste ver histórias assim se repetirem, mas tão cansativo quanto é perceber que algumas empresas ainda fecham os olhos para tipos que promovem esse tipo de conduta, simplesmente porque as metas são entregues, as vezes construídas apenas em planilhas e relatórios. Muito “sambarilóvi” e pouca integridade. Sejamos fortes e lutemos bravamente pelo que é certo. E certo, no caso, pode ser chamado de verdade e correção.

Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor.

Luis Alcubierre

Luis Alcubierre é executivo de Comunicação Corporativa, Relações Institucionais e Governamentais há mais de 25 anos e hoje atua como conselheiro para a América Latina da Atrevia, agência espanhola de PR e Corporate Affairs, além de liderar o escritório Advisor Comm. É também palestrante, mediador e mentor. Formado em Comunicação Social pela FIAM, possui pós-graduação em Administração de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas e MBA pela FIA-USP, com diversos cursos de gestão de liderança e negociação realizados em instituições como IESE, Berlin School of Creative Leadership, Columbia Business School, Universidad Adolfo Ibañez, Escuela Europea de Coaching, Fundação Dom Cabral, IBMEC e FGV. Foi diretor de Comunicação e Assuntos Corporativos de empresas como Kellogg, Pernambucanas e Samsung, onde teve responsabilidades adicionais pela Comunicação na América Latina. No Grupo Telefônica, assumiu a Direção Global de Marca e Comunicação da Atento em Madrid, na Espanha, sendo responsável pela gestão da área em 17 países. Passou ainda por Dow Química, TNT (adquirida posteriormente pela Fedex) e Rede (antiga Redecard), tendo iniciado sua carreira no rádio, nos sistemas Jornal do Brasil e Grupo Estado. Também foi membro do Conselho de associações ligadas às indústrias de alimentos, varejo, vestuário e mercado financeiro, onde teve importante papel negociador em distintas esferas de governo.

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