06 de abril de 2023

Um Século de Comunicação Corporativa. Como Public Affairs cresceu com ela e as diferenças entre Lobby, Advocacy e RIG.

Publicado originalmente no LinkedIn, em 06 de abril de 2023

A história tem seu berço nos Estados Unidos, com os conceitos propostos pelo jornalista Ivy Lee, considerado o pai das relações públicas. A área ficou tão grande e relevante que hoje se divide em distintas funções, algumas delas ganhando independência e especialidades.

A comunidade de profissionais de Comunicação Corporativa no Brasil é grande e com gente muito competente. A área deixou de ser há muito uma promessa e a organização que não a colocou na estratégia, ficou obsoleta. No entanto, muita gente ainda não entende quais atividades fazem parte dela, porque nem todos os que atuam nessa área desempenham as mesmas funções e isso acontece porque seu escopo é amplo e sua estrutura varia de acordo com o tamanho e o tipo de empresa que a constitui. Sem contar que a gestão da Comunicação Corporativa é muito diferente hoje do que foi há algumas décadas, quando se consolidou.

As razões de sua existência, no entanto, permanecem as mesmas de seu agente seminal, o jornalista Ivy Lee, que na primeira metade do Século XX desempenhou um papel fundamental para a melhoria de imagem de empresários como John Rockefeller Jr. e de empresas como a Pennsylvania Railroad. Lee é o pai das relações públicas e foi o primeiro a defender a comunicação aberta no mercado produtivo, que vivia envolto em escândalos nas condições de trabalho de seus funcionários e nas consequências sociais e ambientais de seus processos.

De maneira geral, a Comunicação Corporativa abarca a gestão e o desenvolvimento de estratégias de comunicação interna e externa de uma empresa, com o objetivo de construir e manter uma imagem positiva e a reputação da organização junto a seus públicos. Falar de Comunicação Corporativa daria um tratado, porque o leque de atividades é imenso: Comunicação Interna, Endomarketing, PR, Comunicação Digital, Gestão de Crise, Comunicação Institucional, Geração de Conteúdo e Narrativas, sem contar as variações que vemos em algumas companhias, como Relações com Imprensa ou Assessoria de Imprensa; Comunicação Organizacional, Comunicação de RH; Employer Branding, Mídias Sociais e as funções que ao longo do tempo foram sendo fundidas à Comunicação Corporativa, como Filantropia, Responsabilidade Social Corporativa, que vai dando espaço para o Social dentro do ESG; e Public Affairs, que se refere às atividades de uma organização para influenciar a opinião pública e moldar as políticas públicas.

Public Affairs começou a fazer parte das estruturas de Comunicação Corporativa nos anos 80, com o aumento da globalização e da influência dos governos nas empresas. No Brasil, a data se confunde também com o processo de redemocratização e da Constituinte. Refere-se ao conjunto de atividades que as empresas realizam para gerenciar e influenciar o ambiente regulatório e político, participando ou não da definição de políticas públicas e pode depender de esforços de Relações Institucionais e Governamentais (RIG), do Lobby, do Advocacy ou outras formas de engajamento com autoridades e a sociedade.

À medida que as empresas se tornaram mais ativas na promoção de seus interesses junto aos governos e ao público em geral, a necessidade de uma abordagem estratégica de comunicação se tornou mais importante. Com isso, a área foi ganhando espaço e em muitos casos hoje é tratada separadamente, tamanha importância passou a ter em alguns organogramas corporativos. As complexidades, entretanto, foram crescendo com seu aperfeiçoamento e ainda há incompreensão a respeito das diferenças de suas atividades, apesar de encontrarmos intersecções.

Logo de início as pessoas se perguntam por que as empresas devem estabelecer influência em esferas e níveis de Governo? A resposta é simples: porque em uma sociedade democrática de direito, todos precisam fazer parte do debate. Dialogar é a melhor maneira para avançarmos em uma sociedade livre, sem tutelas, embora com preceitos que favoreçam o equilíbrio. As autoridades executivas ou legislativas ao serem eleitas não têm a obrigação de saber tudo sobre tudo. As perspectivas distintas sobre leis, decretos, portarias, resoluções, instruções normativas, regulamentos e qualquer outro instrumento que mude uma regra e que impacte as pessoas precisam ser levadas em conta e somente com a participação de toda a sociedade isso é possível.

Entendido isso, vamos às diferenças:

Lobby: É a prática de influência de autoridades governamentais em nome de interesses privados ou públicos específicos em relação a decisões políticas e regulatórias, seja por meio do contato direto com aqueles que têm o poder decisório ou por meio de campanhas públicas. A Lei do Lobby, em tramitação no Congresso Nacional, é um marco importante no processo de amadurecimento do Advocacy no Brasil. A nova legislação propõe a regulamentação da atividade e estabelece regras para a atuação de profissionais que buscam influenciar as decisões dos Poderes. A importância de regulamentá-la é fundamental para que o processo de defesa dos interesses setoriais seja cada vez mais transparente e ético no Brasil. Com regras claras e bem definidas, é possível estabelecer limites para a atuação dos profissionais da área, garantir a transparência das relações entre o setor público e privado e fortalecer a democracia.

Advocacy: Trata-se de uma prática mais ampla e pode ou não incluir a atividade de Lobby, mas também envolve o trabalho para aumentar a conscientização sobre questões importantes e mobilizar a opinião pública em torno dessas questões. É um processo de defesa de interesses coletivos ou individuais que busca promover mudanças sociais positivas, envolvendo ações como campanhas de conscientização, pesquisa, educação e pressão pública. No Brasil, o desenvolvimento do Advocacy ganhou força nas últimas décadas, acompanhando o crescimento do setor empresarial e a maior participação da sociedade civil na vida política do país.

Relações Institucionais e Governamentais: É o conjunto de práticas que envolvem o relacionamento com o governo e outras partes interessadas para influenciar políticas públicas e regulamentos em benefício de uma organização ou setor. Envolve a construção de relacionamentos com autoridades governamentais, partidos políticos, grupos de interesse, organizações da sociedade civil, entre outros, para entender as políticas e regulamentações que afetam uma organização ou setor e promover mudanças positivas nas políticas.

Embora haja sobreposição nas práticas dessas atividades, cada uma delas tem suas diferenças. É comum que algumas pessoas usem os termos de forma intercambiável. Relações Institucionais e Governamentais, Lobby e Advocacy podem ser distintos em termos de suas abordagens, objetivos, táticas e estratégias. No entanto, na grande maioria das vezes essas atividades trabalham juntas ou são complementares na defesa de interesses de empresas, organizações e setores. Em outras palavras, na prática, tudo acontece ao mesmo tempo.

Importante entender, apenas, que as diferenças nos ajudam a escolher a melhor estratégia a fim de defender os interesses de uma organização ou setor, cuidando sempre das práticas de Governança para que a transparência dite o jogo.

Se gostou deste artigo ou do assunto, procure estes títulos publicados pela Aberje e conheça mais sobre o tema.

Lobby: O que é. Como se faz: ética e transparência junto a governo.

Saïd Farhat (2007)

Relações Governamentais & Lobby: Aprendendo a Fazer.

Gilberto Galan (2010)

Comunicação pública: por uma prática mais republicana

Paulo Nassar (2019)

Lobby digital: como o cidadão conectado influencia as decisões de governos e empresas

Renard Aron (2020)

Lobby e comunicação: a integração da narrativa como via de transformação

Paulo Nassar e Carlos Parente (2020)

Regras novas, jogadores antigos: Um ensaio sobre o presente e o futuro da atividade de Relações Institucionais e Governamentais (RIG)

Leonardo Barreto e Carlos Parente (2023)

Em parceria com a ABCPública, fruto do Programa avançado em Comunicação Pública

Glossário de Comunicação Pública (2020)

Comunicação pública na prática: depoimentos (2021)

Comunicação públicas: casos excelentes (2022)

Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor.

Luis Alcubierre

Luis Alcubierre é executivo de Comunicação Corporativa, Relações Institucionais e Governamentais há mais de 25 anos e hoje atua como conselheiro para a América Latina da Atrevia, agência espanhola de PR e Corporate Affairs, além de liderar o escritório Advisor Comm. É também palestrante, mediador e mentor. Formado em Comunicação Social pela FIAM, possui pós-graduação em Administração de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas e MBA pela FIA-USP, com diversos cursos de gestão de liderança e negociação realizados em instituições como IESE, Berlin School of Creative Leadership, Columbia Business School, Universidad Adolfo Ibañez, Escuela Europea de Coaching, Fundação Dom Cabral, IBMEC e FGV. Foi diretor de Comunicação e Assuntos Corporativos de empresas como Kellogg, Pernambucanas e Samsung, onde teve responsabilidades adicionais pela Comunicação na América Latina. No Grupo Telefônica, assumiu a Direção Global de Marca e Comunicação da Atento em Madrid, na Espanha, sendo responsável pela gestão da área em 17 países. Passou ainda por Dow Química, TNT (adquirida posteriormente pela Fedex) e Rede (antiga Redecard), tendo iniciado sua carreira no rádio, nos sistemas Jornal do Brasil e Grupo Estado. Também foi membro do Conselho de associações ligadas às indústrias de alimentos, varejo, vestuário e mercado financeiro, onde teve importante papel negociador em distintas esferas de governo.

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