Em defesa da Comunicação Responsável como 18º Objetivo de Desenvolvimento Sustentável
“O mundo deve enfrentar danos provocados pela disseminação de discursos de ódio e mentiras online, ao mesmo tempo em que fortalece os direitos humanos”, disse o Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, em 24 de junho de 2024
“Os Princípios Globais das Nações Unidas para a Integridade da Informação visam capacitar as pessoas a exigir seus direitos. Em um momento em que bilhões de pessoas estão expostas a informações falsas, distorções e mentiras, esses princípios traçam um caminho claro a seguir, firmemente enraizado nos direitos humanos, incluindo os direitos à liberdade de expressão e opinião”, continuou Guterres.
Os princípios criam uma estrutura para uma ação internacional coordenada para tornar os espaços de informação mais seguros e humanos, o que a ONU considera uma das tarefas mais urgentes do nosso tempo. Desinformação, informações falsas, discurso de ódio e outros riscos para o ecossistema de informação estão fomentando conflitos, ameaçando a democracia e os direitos humanos, e comprometendo a saúde pública e a ação climática. A proliferação de desinformação e informações falsas está agora sendo potencializada pelo avanço das tecnologias de Inteligência Artificial (IA), facilmente acessíveis, aumentando a ameaça a grupos que são alvos frequentes em espaços de informação, incluindo crianças.
Em uma pesquisa global recente com funcionários das Nações Unidas, 80% dos respondentes afirmaram que informações prejudiciais os colocam em perigo, assim como às comunidades que eles servem.
O Secretário-Geral da ONU fez um apelo urgente aos governos, empresas de tecnologia, anunciantes e à indústria de relações públicas para que assumam a responsabilidade pela disseminação e monetização de conteúdos que causam danos.
A atuação global de profissionais de relações públicas e comunicação demonstra que estamos prontos e que somos capazes de transformar essas palavras em ação, enfrentando o desafio proposto pelo Secretário-Geral Guterres.
A Global Alliance for Public Relations and Communication Management, uma organização não governamental sem fins lucrativos que representa mais de 360 mil profissionais, acadêmicos e estudantes em 126 países ao redor do mundo, com o apoio de mais de 100 organizações globais, renova seu apelo às Nações Unidas para que reconheça a importância da comunicação responsável, estabelecendo-a como o 18º Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
Contexto
A comunicação é a base das relações humanas e do desenvolvimento social. Ela forma comunidades, facilita a troca de ideias e sustenta a governança democrática. No entanto, o aumento das notícias falsas e da desinformação ameaça esses elementos fundamentais, corroendo a confiança em instituições, empresas e indivíduos.
Os objetivos desse apelo são:
- Destacar a importância crucial da comunicação responsável na promoção do desenvolvimento sustentável.
- Defender a inclusão de um novo ODS focado em comunicação responsável.
- Fornecer uma estrutura estratégica para a implementação desse novo ODS, incluindo metas principais, indicadores e partes interessadas.
Por que a Comunicação foi omitida como um Objetivo de Desenvolvimento Sustentável?
Em setembro de 2015, após intensas negociações, 193 Estados Membros das Nações Unidas concordaram em adotar 17 ODS e 169 metas como parte do documento: “Transformando Nosso Mundo: A Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável”. O documento serve como um guia para todos os países resolverem os problemas mais urgentes do mundo até 2030 – erradicar a pobreza e a fome, enfrentar as mudanças climáticas, proteger o planeta, promover vidas saudáveis e plenas, criar comunidades justas e inclusivas, alcançar a equidade de gênero, garantir educação de qualidade, entre outros.
Não foi definido um papel para a comunicação como um objetivo específico com metas claras nos ODS. Essa lacuna ficou clara durante a pandemia global de COVID-19. O mundo sobreviveu principalmente com base na infraestrutura de comunicação disponível, provando que a comunicação é essencial para a sobrevivência humana. Enquanto a era digital impulsiona – e altera – as mudanças sociais em uma escala e com uma rapidez nunca vistas, os ODS não tocam no assunto da comunicação.
Por essa razão, em setembro de 2023, a Global Alliance, apoiada por mais de 100 organizações de comunicação ao redor do mundo, incluindo acadêmicos, profissionais e estudantes, fez um apelo direto a António Guterres, Secretário-Geral das Nações Unidas, para a criação de um Objetivo de Desenvolvimento Sustentável separado para a comunicação.
Enquanto isso, Jan Servaes (ex-Cátedra da UNESCO em Comunicação para Mudança Social Sustentável) e Muhammad Jameel Yusha’u (Harvard Kennedy School) editaram e publicaram dois volumes do livro SDG 18 Communication for All (“ODS 18 Comunicação para Todos” em tradução direta do inglês), que detalha argumentos a favor de um ODS dedicado à comunicação confiável, considerando que ela deve ser vista como um direito humano fundamental. Em um editorial de maio de 2019, a World Association of Christian Communication (WACC) afirmou que os ODS negligenciaram a inclusão do papel importante desempenhado pela comunicação na expansão e fortalecimento dos “espaços cívicos públicos por meio de acesso equitativo e acessível às tecnologias e plataformas de comunicação, plataformas de mídia e diversidade de mídia”.
A Importância da Comunicação Responsável
A Global Alliance reitera a necessidade urgente de um ODS separado para a comunicação, especificamente para a comunicação responsável.
Comunicação responsável significa:
- Diálogo aberto sobre desafios globais, como mudanças climáticas, redução da pobreza e democracia.
- Considerar o diálogo como a ferramenta mais poderosa.
- Liberdade de opinião e de imprensa.
- Abordagem ética às comunicações organizacionais e institucionais, baseadas em fatos.
- Luta contra notícias falsas, desinformação e qualquer tipo de propaganda.
- Educar pessoas para usarem suas habilidades de comunicação, especialmente nas redes sociais, de forma responsável.
- Apoio público e privado ao jornalismo rigoroso e responsável.
- Apoio à diversidade, inclusão e igualdade de gênero.
- Empatia com aqueles que sofrem de fome, pobreza, falta de oportunidades, guerra, migrações forçadas e todas as discriminações.
- Linguagem positiva e inclusiva.
Em outras palavras, a comunicação responsável constrói confiança e coesão social. A confiança é a base de relacionamentos eficazes e da harmonia social. A comunicação responsável garante que as relações humanas sejam baseadas na verdade, promovendo um clima de confiança que é essencial para a convivência com a diversidade.
Ao promover informação factual e diálogo ético, a comunicação responsável ajuda a construir e manter essa confiança. A comunicação responsável combate a desinformação e o proselitismo. A proliferação de notícias falsas afeta a democracia e a estabilidade social. A comunicação responsável envolve a disseminação de informações factuais, reduzindo a propagação de desinformação, além de ensinar as pessoas a reconhecer e combater notícias falsas, aumentando assim a alfabetização midiática.
A comunicação responsável apoia a governança democrática. A democracia prospera com a participação informada dos cidadãos. A comunicação responsável garante que os cidadãos tenham acesso a informações precisas, permitindo-lhes tomar decisões informadas e responsabilizar as instituições. Ela promove a transparência e o fluxo ético de informações, que são cruciais para a governança democrática. A comunicação responsável promove o entendimento global e a empatia ao destacar perspectivas diversas e experiências humanas compartilhadas. Ela incentiva uma linguagem positiva e inclusiva, apoiando os esforços para enfrentar desafios globais como a pobreza, as mudanças climáticas e a desigualdade.
O motivo para um novo Objetivo de Desenvolvimento Sustentável
É necessário traduzir a grande agenda dos ODS para o nível local, unindo narrativas locais e globais. Com determinações transversais como ‘não deixar ninguém para trás’ e adotando uma ‘abordagem centrada nas pessoas’, não há outra maneira senão acertar na comunicação. É necessária uma abordagem de baixo para cima, com múltiplos stakeholders participando do desenvolvimento. À luz disso, um novo ODS iria:
- Abordar as Lacunas de Comunicação nos ODS Atuais: Embora a comunicação seja um componente-chave de muitos ODS existentes (especialmente no ODS 16), não há um objetivo dedicado que aborde de maneira abrangente seu papel no desenvolvimento sustentável. Um novo ODS sobre comunicação responsável preencheria essa lacuna, fornecendo uma estrutura executiva e garantindo que a comunicação seja utilizada para apoiar todos os ODS.
- Responder a Desafios Globais Emergentes: A era digital introduziu novos desafios, incluindo a rápida disseminação de desinformação e a erosão da confiança nas instituições. Um ODS dedicado à comunicação responsável abordaria esses desafios promovendo o jornalismo ético, a alfabetização digital e o uso responsável das tecnologias de comunicação.
- Alinhar-se com Estruturas e Acordos Internacionais: O ODS proposto alinha-se com estruturas internacionais, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que reconhece o direito à liberdade de opinião e expressão, e os princípios de jornalismo ético promovidos pela UNESCO. Também apoia iniciativas globais sobre governança da internet e inclusão digital.
O objetivo do novo ODS seria: ‘Garantir a comunicação responsável e promover a confiança, o diálogo informado e a coesão social para apoiar o desenvolvimento sustentável’.
As metas principais seriam as seguintes:
- Promover a Alfabetização em Mídia, Relações Públicas e Informação: Garantir que pessoas e organizações possuam as habilidades para avaliar criticamente a informação e se engajar de forma responsável no ambiente digital.
- Apoiar a Ética e o Profissionalismo: Promover padrões para práticas midiáticas éticas e criação responsável de conteúdo em todas as profissões de comunicação.
- Combater a Desinformação: Fortalecer mecanismos para identificar, combater e mitigar os impactos da desinformação.
- Aumentar a Confiança nas Instituições: Promover a transparência e a responsabilidade nas instituições públicas e privadas.
- Fomentar a Comunicação Inclusiva: Garantir que plataformas e conteúdos de comunicação sejam inclusivos e acessíveis a todos, incluindo comunidades marginalizadas e vulneráveis.
Próximos passos
- Colaboração Multissetorial. A implementação bem-sucedida do proposto ODS 18 requer colaboração entre governos, organizações internacionais, sociedade civil, academia, setor privado e organizações de mídia. Estabelecer parcerias e coligações facilitará o compartilhamento de recursos, expertise e melhores práticas.
- Quadros de Políticas e Regulatórios. Os governos devem desenvolver e aplicar regulamentações que promovam a comunicação responsável, protejam a liberdade de expressão e garantam a inclusão digital. Isso inclui leis para combater a desinformação, proteger a privacidade de dados e apoiar programas de alfabetização digital.
- Capacitação e Educação. Investir em educação é crítico para alcançar as metas do ODS proposto. Isso inclui capacitação para jornalistas, comunicadores, educadores e líderes comunitários, assim como a integração da alfabetização midiática, de comunicação e de informação nos currículos educacionais em todos os níveis.
- Inovação Tecnológica e Infraestrutura. Promover a inovação tecnológica e investir em infraestrutura de comunicação são essenciais para reduzir a divisão digital. Isso inclui expandir o acesso à banda larga, desenvolver dispositivos de comunicação acessíveis e apoiar iniciativas de inclusão digital.
- Monitoramento e Avaliação. Estabelecer mecanismos robustos de monitoramento e avaliação é vital para acompanhar o progresso em relação ao ODS proposto. Isso inclui desenvolver indicadores, coletar dados e realizar avaliações regulares para garantir a responsabilidade e informar ajustes de políticas.
Em um mundo interconectado, a comunicação responsável é fundamental para o desenvolvimento sustentável. Ao estabelecer um novo ODS dedicado à comunicação responsável, podemos enfrentar os desafios impostos pela desinformação, reconstruir a confiança nas instituições e promover sociedades informadas, inclusivas e resilientes. Apelamos aos líderes globais, formuladores de políticas e partes interessadas para que reconheçam a importância crítica da comunicação na realização de um futuro sustentável e tomem ações coletivas em direção a esse objetivo.
O momento é agora… enquanto ainda podemos.
Por e em nome da Global Alliance for Public Relations and Communication Management.
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