27 de julho de 2016

Entrevista: tendências, segundo o antropólogo Ignácio Garcia

Nos últimos anos, consultorias têm tentado monitorar a evolução das redes de influenciadores local e globalmente sobre sustentabilidade, saúde, nutrição, biotecnologia, fin-tech (finanças+tecnologia), beleza e entretenimento.

Desvendar quem são os influenciadores em determinado segmento de atuação aporta inteligência social para alimentar as áreas de pesquisa&desenvolvimento, marketing, comunicação corporativa e branding, entre outras. Esse trabalho de monitoramento da pisada digital e conexões implí­citas de influenciadores e fontes digitais relevantes, identificando tendências e desenhando cenários futuros em segmentos específicos, é algo bastante inovador. E isto acontecer por meio da entrega de relatórios sob medida com as tendências emergentes, movimentos comportamentais e oportunidades de inovação baseadas em pesquisa netnográfica e de cenários futuros, é um desejo que está no topo da lista dos comunicadores corporativos.

O antropólogo social argentino Ignácio Garcia, um dos fundadores – ao lado da antropóloga brasileira Shalla Monteiro – da Tree Intelligence, é um dos profissionais que está na ponta destes processos. E por isso é chamado para uma breve entrevista aqui no blog Futurologia.

 

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Ele tem mais de 10 anos de experiência internacional em consultoria de aplicação da ciência das redes, ciência de dados e etnografia digital para empresas da Fortune 500, tais como Coca-Cola, Mondelez, Natura e Turner Entertainment. Na área acadêmica, trabalhou com economia social dentro de equipes interdisciplinares junto com universidades de prestígio, como Universidade de Miami, Universidade de Columbia, Universidade de Buenos Aires e Universidad Autónoma de México.

 

1) O que são tendências, em sua opinião?

São distintas intensidades de identificação de padrões de comportamento associadas a um determinado tema, contexto e período de tempo.

 

2) Qual a importância dos empreendimentos investirem na detecção de tendências hoje em dia?

Na era da (hyper) conectividade e da (sobrecarga) da informação, não considerar as principais tendências e os seus potenciais impactos no modelo de negócio dos empreendimentos – sejam estes novos ou já consolidados – seria como navegar na completa escuridão e sem bússola.

 

3) o trabalho de identificação de tendências não é afetado pela alta dinâmica da sociedade, que muda todo dia, e portanto os insights podem ter baixa durabilidade?

Depende do segmento. Por um lado, a alta interconectividade dos indiví­duos no ambiente digital tem aumentado drasticamente o surgimento e sobretudo a difusão de tendências intra-category e cross-category. Todavia, é fundamental entender a dinâmica de cada segmento, o seu tempo e processo de adoção de inovação a partir da identificação e seleção de tendências.

Tomemos como exemplo o segmento da moda, o qual é estruturado e sazonal. As tendências são coletadas, catalogadas e filtradas no começo do processo de pesquisa e desenvolvimento para finalmente gerar linhas de produtos. Um olhar histórico evidencia constantes reconceitualizações dos mesmos elementos básicos e poucas disrupções. Por outro lado, os segmentos da tecnologia (como o mercado mobile) e da saúde (como o desenvolvimento de drogas oncológicas) têm avançado muito rápido nos últimos 20 anos. Todavia, estão atrelados a processos de lançamento de produtos muito rigorosos.

 

4) Por que trabalhar com tendências e qual a maior dificuldade na prestação deste tipo de serviço? Há diferenças deste trabalho ser realizado no Brasil ou outro paí­s?

Como antropólogo digital, vejo na dinâmica das redes sociais a principal força da evolução comportamental da sociedade contemporânea, sendo as tendências uma das suas principais (e incipientes) manifestações. Portanto, é como abrir uma janela para o futuro.

Já como profissional, com 10 anos de consultoria global, percebo como os nossos clientes valorizam cada vez mais o valor estratégico que os nossos mapas de influenciadores e fluxos de tendências tem para as suas áreas de pesquisa e desenvolvimento, marketing, comunicação e branding, entre outras. Lamentavelmente este tipo de interesse no mapeamento, monitoramento e gestão das redes de influenciadores que determinam e difundem tendências é ainda considerado um luxo no que tange a conhecimento estratégico e, portanto, as organizações de pequeno e médio porte desconhecem ou acreditam que este tipo de serviço não é imprescindí­vel para a sua sobrevivência.

Quando se trata de organizações de grande porte e orientadas à  inovação, as suas matrizes costumam estar fora do Brasil (com exceção de empresas brasileiras inovadoras, como a Natura, para a qual trabalhamos há mais de 5 anos). Portanto, as decisões sobre inteligência de mercado costumam ser tomadas fora do Brasil (incluso para pesquisas regionais), estando também mais abertas a novas maneiras de entender o mundo e se diferenciarem nele. Em parte, foi por isso que no final do ano passado decidimos estar presentes em Genebra/Suí­ça, onde existe um sofisticado ecossistema de negócios caraterizado pela procura de soluções para problemas globais (concentrados em alguns eventos promovidos por organizações como as Nações Unidas, a Organização Mundial da Saúde e o World Economic Forum).

 

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Imagem de parte da rede de influenciadores sobre o tema “Crise Hí­drica no Brasil”, destacando a SABESP como um dos nós centrais da rede

 

5) como funciona a análise de influenciadores nas redes digitais e como isso pode ser utilizado como insumo para marketing, comunicação e branding?

A nossa metodologia de inteligência de redes se baseia na identificação de influenciadores em distintas temáticas. Coletamos o big data (hoje quase um commodity) e o transformamos em poderosas visualizações de redes de relacionamento entre atores (pessoas fí­sicas e jurí­dicas), identificando: quem é quem; a quem influenciam; por quem são influenciados; qual o seu posicionamento sobre determinadas questões-chaves.

Uma vez desvendado o mapa de relacionamentos dos influenciadores (que incluem pesquisadores, empresários, blogueiros, trend setters, médicos, celebridades), monitoramos o fluxo semântico (discussões, opiniões e percepções) entre eles. A partir daí­, uma equipe de netnógrafos dá contexto e significado aos padrões emergentes e responde perguntas especí­ficas, como:

  1. quais são as tendências latentes e emergentes para o segmento em questão?
  2. qual a direção dessa tendência e qual o impacto no negócio do cliente?
  3. quais os pontos centrais da rede (pessoas fí­sicas e jurí­dicas) que podem ser engajados para desenvolverem produtos ou campanhas de comunicação eficientemente?
  4. quais são os cenários futuros para o cliente e aonde estão as oportunidades e ameaças?
  5. como aproveitar o conhecimento da rede para se diferenciar?

 

Este processo de descoberta de conhecimento (que vai desde a coleta de dados diversos até a entrega de conhecimento estratégico, passando pela identificação de informações relevantes) é desenvolvido de maneira colaborativa numa plataforma proprietária chamada Livingnethos, que possibilita que os integrantes de um projeto possam ter acesso as bases de dados (data sets), interajam com os módulos de visualização de informações (networks, timelines, maps, word clouds, risk charts) e visualizem os relatórios constantemente atualizados. O registro de insights em cada passo do processo é feito por meio de chats, módulos de experts insights e sistemas de alertas.

Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor.

Rodrigo Cogo

Rodrigo Cogo é o curador do Sinapse Conteúdos de Comunicação em Rede e responsável pela distribuição digital dos canais integrantes da plataforma. Formado em Relações Públicas pela Universidade Federal de Santa Maria, é especialista em Gestão Estratégica da Comunicação Organizacional e Mestre em Ciências da Comunicação, com estudos voltados para a Memória Empresarial e Storytelling, ambos pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (SP). Atuou na Aberje por 14 anos, passando pelas áreas de Conteúdo, Marketing e Desenvolvimento Associativo e tendo sido professor em cursos livres e in company e no MBA da entidade por 10 anos. É autor do livro "Storytelling: as narrativas da memória na estratégia da comunicação".

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