12 de agosto de 2014

Sem demonização

Artigo publicado no Correio Braziliense por Francisco Viana, sob o título Mídia Training modo de usar, abre um amplo debate a sugerir uma visão ampla do significado contemporâneo, isto é, atual, do treinamento para o cada vez mais necessário relacionamento com a mídia. De saída,  três constatações são indispensáveis.

A primeira, é que em hipótese alguma se deve demonizar o mídia training.  Trabalho cada vez mais indispensável para líderes e profissionais de todas as áreas, marca o aprofundamento  do diálogo democrático. Quem faz o mídia training se prepara para formar e informar a opinião pública de maneira elevada, aprendendo a lidar com técnicas da comunicação de qualidade.

A segunda constatação é que o mídia training passou a fazer parte indissociável do negócios da comunicação empresarial brasileira.  Em termos gerais, o resultado econômico anual desse setor estratégico representa R$ 9,3 bilhões, envolvendo sobretudo  o trabalho de milhares de jornalistas, relações públicas, publicitários, entre outros trabalhadores da informação.  Em termos específicos, são milhares de  pessoas que se dedicam à comunicação empresarial, em todo o pais, exercendo atividade que contribui, e muito, para o bom exercício da democracia e da construção da imagem, reputação e identidade das empresas. É um mercado que só tem crescido, impulsionado por grupos  relevantes, de comunicação, a exemplo da FSB, CDN, Press Porter Novelli, Máquina PR e Insight, além de autênticos artesãos da comunicação que fazem trabalho individualizado.

E há ainda o fato de ser uma atividade das mais antigas no pais. Este ano, as relações públicas estão completando seu centenário, uma vez que os trabalhos pioneiros datam de 1914 na antiga Light. Isto mostra que se trata de profissão com conhecimento acumulado, capaz de entender seu tempo e os desafios impostos pelo presente.  Que desafios são estes?

Se olhados de perto, vemos que existem relações promiscuas entre comunicadores, organizações e empresas que precisam ser deixadas de lado. Uma delas, relaciona-se ao fato de jornalistas ligados à redação de fazerem treinamentos. Deveriam, no máximo, serem convidados para falar do jornalismo brasileiro. Nunca para treinarem pessoas. Como superar  o impasse ético de treinar porta-vozes que, no futuro, podem ser seus entrevistados?

Outro aspecto é como a comunicação pode lidar com gestores ineficientes ou corruptos. Como convencer lideranças de que manipular a comunicação tira o seu valor porque afeta a credibilidade dos organizações e, portanto, a credibilidade das mensagens?

A comunicação é herdeira do seu tempo. Hoje, a democracia exige que se crie novos modelos de dialogo com a sociedade. As razões são efetivas: as mídias sociais estão mudando o conceito de verdade como algo que se impõe e trazendo à luz a ideia de que a verdade é aquilo que ganha concretude para o exercício efetivo da cidadania.
Dai, os fatos serem subversivos. Subvertem meias verdades, mitos, heróis, versões oficiais. Tudo isso, em tempo real. São indicadores de novos caminhos tanto para o mídia training, como para os horizontes da comunicação.

Em O anel dos Nibelungos, Wagner adverte sucessivas vezes: “Acorde, acorde, acorde.” É o momento de acordar. Significa que o comunicador não pode ser apenas o bombeiro, o portador de boas notícias ou aquele que só convence, como se o mundo fosse um eterno céu azul, sem turbulência. Vivemos novos tempo, mudaram-se as vontades, a forma de fazer politica ganha nova dimensão.

Quer dizer, é imperativo repensar o sentido, sem perder de vista as boas práticas, a eficiência técnica e a abrangência do mídia training. Envolve desde a postura à fala, da forma como os jornalistas trabalham – sobretudo a contradição dos fatos – ao conteúdo das pautas, a prevenção e gestão de crises e os posicionamentos.

Consiste, também, emvisão política clara a respeito de uma sociedade em que o cidadão exige transparência. O artigo de Viana sugere que se amplie e fortaleça o debate em torno de uma prática antiga que precisa seguir o passo de um novo Brasil.

No caso da Comunicação Empresarial, nosso papel é ser o guardião da ética, da técnica e da estética de uma conquista de comunicadores que fazem seu trabalho com eficiência e não desejam vê-lo demonizado. Pelo contrário, buscam transformá-lo em prática universal e construtiva. Uma prática útil de rara utilidade para a cidadania e vida.

Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor.

Paulo Nassar

Diretor-presidente da Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (Aberje); professor titular da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP); doutor e mestre pela ECA-USP. É coordenador do Grupo de Estudos de Novas Narrativas (GENN), da ECA-USP; pesquisador orientador de mestrado e doutorado (PPGCOM ECA-USP); pesquisador da British Academy (University of Liverpool) – 2016-2017. Entre outras premiações, recebeu o Atlas Award, concedido pela Public Relations Society of America (PRSA, Estados Unidos), por contribuições às práticas de relações públicas, e o prêmio Comunicador do Ano (Trajetória de Vida), concedido pela FundaCom (Espanha). É coautor dos livros: Communicating Causes: Strategic Public Relations for the Non-profit Sector (Routledge, Reino Unido, 2018); The Handbook of Financial Communication and Investor Relation (Wiley-Blackwell, Nova Jersey, 2018); O que É Comunicação Empresarial (Brasiliense, 1995); e Narrativas Mediáticas e Comunicação – Construção da Memória como Processo de Identidade Organizacional (Coimbra University Press, Portugal, 2018).

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