As metamorfoses da privacidade
Mailings e proteção de dados pré e pós LGPD
A formação das listas de contatos para relacionamento com a imprensa – os famosos mailings – mudou desde o início desta prática. O mais interessante é que saiu o disquete e entrou o Excel, saiu o fax e entrou o e-mail ou Whatsapp e, mesmo assim, ainda nos deparamos com os mesmos dilemas éticos e legais para comunicação eletrônica: quem tem direito de propriedade e privacidade sobre o banco de dados de contatos? A quem pertence o lead? Quem tem direito de explorar um e-mail e com que fim?
Em tempos de leis de Proteção de Dados mundo afora, as perguntas são pertinentes em vários âmbitos, do envio de Press Releases ao funil de vendas no Inbound Marketing.
Na década de 1980, a lista de contatos era valiosa e o relacionamento entre assessores e jornalistas se calcava no sigilo. Os contatos eram concedidos para poucos privilegiados e ‘ter um mailing’ fazia parte do currículo de um Assessor de Imprensa de respeito.
Este 1º ciclo começou a mudar quando os primeiros fornecedores do setor passaram a elaborar uma lista de contatos atualizada mensalmente e repassada para as agências via disquetes. Obviamente, mailing deixava de ser um diferencial.
A democracia dos contatos
Após tal fase (que chamamos de ‘democratização dos contatos’), por volta dos anos 2000 chegou um 2º ciclo: o e-mail.
Até então, pautas eram sugeridas por telefone ou enviadas por fax, procedimento caro, seletivo e lento. Com o e-mail, a interação se tornou barata, direta e irrestrita. Por isso, tivemos a explosão das agências de comunicação, principais beneficiadas das mudanças setoriais.
Ao mesmo tempo, os muros do sigilo caíram… a troca de dados via internet deu acesso público às listas de e-mail (principalmente quando estas tornaram arquivos em Excel). O mercado passou por uma guinada: do acesso restrito da fase inicial para a cessão/empréstimo de listas entre os colegas.
Fim do ‘spray and pray’
Neste 2º ciclo, impera a automação do envio de e-mails em massa. Contudo, isso possibilita equívocos, como disparos de sugestões de pauta cada vez maiores (10, 15 mil contatos), com a esperança de conseguir algum “peixe grande” da imprensa. Tal prática é ironicamente classificada de “spray and pray”, fruto da exigência por resultados.
O relacionamento com stakeholders pós-lei de dados promete um 3º ciclo, que, de certa forma, resgata e revisa o 1º. O contato será novamente privilegiado e restrito aos profissionais mais estratégicos e o mailing será encarado como patrimônio da agência que investiu na consolidação e proteção destes contatos. Ao mesmo tempo, a lei brasileira de proteção de dados (início em agosto de 2020) defende a cibersegurança do local onde os dados são armazenados e criminaliza mailings salvos em planilha.
Mas como este 3º ciclo vai acontecer na prática dentro das agências de relações públicas?
Todos sabemos que a comunicação corporativa, principalmente, se move rumo às práticas e conceitos do Public Relations. Vemos as agências migrando para práticas multidisciplinares, com criatividade nas abordagens de um lado e relacionamento com o destinatário de outro, entremeadas por conteúdos e práticas realmente relevantes.
E, para sustentar tal avanço, o elo forte para deixar de massificar e passar a unificar é a tecnologia e inteligência artificial.
Em termos práticos, o “spray and pray” deixa de existir e dá lugar para as “Relações Estratégicas”: conteúdos extremamente assertivos e diferenciados, enviados para contatos que deram autorização para recebê-los (por meio de opt-in) e que se interessam pelo conteúdo enviado. Ao mesmo tempo, o indivíduo dono do dado pode moderar se deseja ter relacionamento eletrônico com os conteúdos, assessores ou agências.
Com isso, a privacidade dos dados, que já foi um luxo de poucos, agora se torna o principal fator de sucesso – uma importante metamorfose que nem todos percebem, mas já estamos vivendo.
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