Só cabe sucesso nas suas histórias?
Você já se deu conta que a história de vida da maior parte dos gestores só teve acerto? Tudo deu certo: infância, escola, amigos, universidade, primeiro emprego… Sei bem que a função arquetípica da figura do herói é ser inspirador, e então busca-se revestir estes líderes com partes específicas de suas trajetórias que possam ser vistas como exemplares. Mas se pretendemos, como comunicadores organizacionais, conseguir obter uma conexão entre as chefias a suas equipes, ou entre os contratantes e seus fornecedores, ou entre os entrevistados e os jornalistas, não está mais que na hora de colocar outras verdades nos discursos?
Bem, isto é um pedaço do que tenho estudado em torno do storytelling como narrativa da experiência. Entre as características que cada vez mais têm sido celebradas como novos propulsores de um link emotivo, intenso e memorável entre as pessoas envolvidas numa determinada conversa, estão a narrativa em primeira pessoa, o tom confessional, os detalhes pessoais, a fala emotiva, o estilo mítico, o sentido aberto e… as vulnerabilidades!!!
Por vulnerabilidade, entenda-se o conceito vindo do próprio dicionário: qualidade de vulnerável, desprotegido; condição de risco em que uma pessoa se encontra; conjunto de situações mais ou menos problemáticas que situam a pessoa numa perspectiva inferior a uma demanda com que convive e a afeta…
Sabe-se que toda organização tem algo que funciona direito, aspectos que lhe dão vida quando ela é vital, efetiva e bem-sucedida. O problema é fazer deste núcleo positivo a preponderância ou exclusividade de nossas exposições e pontos de interface, mesmo que eles aumentem a energia e inspirem ações de mudança. Chega um ponto em que a retórica organizacional resta questionada exatamente pela inabilidade em tratar dos fracassos, das instabilidades, dos retrocessos, dos titubeios.
Concordo que foco em competências essenciais, talentos e habilidades, evidenciando as melhores práticas realizadas, é um caminho. Mas a ideia de construir um ideal é fantasiosa demais para a árdua realidade dos ambientes de trabalho. A teoria do processo de Investigação Apreciativa indica quatro fases principais: descobrir, sonhar, desenhar e executar. Na etapa do “sonhar”, é a hora de mergulhar nas histórias e ideias inspiradoras recolhidas para criar imagens novas e desafiantes da empresa e de seu futuro em torno do bom, do melhor e do possível. E só fico imaginando a beleza e a efervescência das histórias de dúvida, e o quanto elas podem também ser importantes para se buscar novos comportamentos.
Sim, o sucesso não vem fácil e por isso deve ser comemorado. Aliás, na maior parte das vezes, ele só dá as caras depois de muito esforço e muitas tentativas fracassadas. A regra é bem ilustrada por uma frase de Wiston Churchill: “O sucesso é ir de fracasso em fracasso sem perder entusiasmo”. Veja mais nesta matéria da Revista Época Negócios, intitulada “8 histórias que provam: o sucesso vem com derrotas”. A Folha de S.Paulo abordou o tema há muito tempo, quando viu como instigante um modelo de evento baseado nos fracassos: “No Brasil, falar de erro ainda é tabu, dizem executivos”.
Se você gostou do tema, vale a leitura de ““Eu sou uma pessoa de tremendo sucesso”: representações, identidades e trajetórias de mulheres executivas no Brasil”, tese de doutorado defendida e aprovada na Fundação Getúlio Vargas por Silvana Rodrigues de Andrade. E, para finalizar, deixo o link do vídeo “O Poder da Vulnerabilidade”, em que Brene Brown analisa, após anos de profunda pesquisa, como o fator vulnerabilidade se revela decisivo para as interações humanas, o senso de comunidade e, mais amplamente, para a capacidade humana de sentir empatia e pertencimento.
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