Grupo de liderança da Aberje se reúne para falar sobre conflitos dentro das empresas
Diálogo é troca e consenso nem sempre é bom. Isso ficou claro durante mais um encontro online do LiderCom – grupo exclusivo de líderes da Comunicação Corporativa da associação –, realizado no dia 15 de julho. Participaram da reunião, a professora da Escola Aberje de Comunicação Pamela Seligmann, também consultora especialista em Comunicação Não-Violenta (CNV) e Daniela Grelin, diretora-executiva do Instituto Avon.
Ao abrir o encontro, o diretor-executivo da Aberje Hamilton dos Santos, comentou sobre o tema do ano da associação Conflito, Diálogo e Consenso: a comunicação como construtora de pontes. “Temos uma tendência de esconder um pouco os conflitos ‘debaixo do tapete’ para chegar a falsos consensos. Muitas vezes pensamos ter consensado, mas simplesmente demos uma ajeitada nas coisas e os problemas estão prontos a emergir”, comentou.
Na ocasião, Daniela Grelin, do Instituto Avon, ressaltou a importância do diálogo como prática que auxilia na aproximação da verdade a partir da inteligência coletiva. “Diálogo é feito de trocas em que não avançamos numa linha reta, pelo contrário, a gente avança por meio de aproximações sucessivas, pela escuta, pelo reconhecimento e pela distinção como uma dança em três tempos”, iniciou. “O problema é que o diálogo, muito frequentemente, é substituído pelo que vou chamar aqui de ‘lacração’, onde a escuta é atropelada, o reconhecimento é completamente esquecido e a distinção vira ataque”, completou.
O diálogo é possível? Quando? “Sim, mas dá trabalho, é uma conquista, porque qualquer diálogo precisa partir do princípio de que eu tenho algo a aprender e algo a contribuir”, explicou Daniela. “Por isso mesmo o primeiro passo é ouvir. E aqui estou falando de escuta qualificada, escuta sem julgamento”. A executiva ilustra que essa escuta qualificada é um exercício: você deve ser capaz de reproduzir o que seu interlocutor disse, de modo que ele esteja de acordo com tal interpretação.
O segundo passo, o reconhecimento, é encontrar um ponto em comum. “Ainda que eu não concorde com tudo que o meu interlocutor propõe, será que há algo na argumentação dele que eu sou capaz de concordar? Se sim, minha sugestão é começar por aí”, explicou. “É assim que a gente vai construindo uma ponte de respeito e sanidade, a exemplo dos grandes mestres da retórica, uma arte que foi se perdendo nas plataformas de comunicação, entre perfis anônimos, com caracteres contados, robôs, argumentos superficiais. Nesses espaços a lacração é o nome do jogo”.
“O diálogo é fascinante exatamente porque ele nos permite transcender as nossas limitações e considerar outras ideias, outras informações e outras perspectivas”, destacou Daniela, acrescentando que isso faz parte de um processo de crescimento individual. “É importante tentar ver as nuances e como elas podem ser integradas em uma forma de compreensão mais rica e inovadora”.
O falso consenso
Na oportunidade, Daniela propôs uma reflexão sobre quais são as alternativas ao diálogo: “um deles é o falso consenso, mas existem outros bastante graves. As teorias da conspiração; a violência psicológica, moral e física; a censura. Mas nenhuma dessas alternativas é melhor do que o diálogo. Diálogo não é sobre comunicação apenas, é sobre convivência, porque falar nos ajuda a pensar e, portanto, a abertura ao diálogo é uma abertura à existência da outra pessoa e a sua liberdade de pensar”, disse. “O exercício do diálogo é o exercício da civilidade e se quisermos viver em comunidade estamos fadados ao diálogo”, concluiu.
Para Pamela Seligmann, é difícil acreditar que o consenso seja algo extremamente bom. “Socialmente o consenso é perigoso, pois é o domínio de um pensamento único e isso é perigoso na construção de uma sociedade, é perigoso na educação, na família. Prefiro a palavra convívio. Como a gente escolhe conviver com pontos de vista diferentes que se somam, se agregam, se combinam, que constrói juntos”, acentuou.
“Martin Buber [filósofo, escritor e pedagogo austríaco naturalizado israelense] parte de um pressuposto que a gente esquece quando fala de diálogo: o eu-tu consiste no relacionamento pleno entre dois seres, englobando em sua amplitude os sentimentos e ideias de ambos; enquanto que o eu-isso – quando se coisifica o outro – envolve a relação entre um ser e uma parte do outro, limitando-o e reduzindo-o”, explicou Pamela. “Não sabemos lidar com o diferente, ainda quando o diferente nos perturba, o tornamos uma ameaça tão grande que, automaticamente, nos separamos dessa pessoa e a tornamos desumana”.
Daniela salienta que a Comunicação é uma função pivô, que está no centro das pressões, muitas vezes para se posicionar por questões culturais. “Na empresa, muitas vezes, em nome da diversidade e da inclusão, a gente acaba sendo excludente; em nome da heterodoxia, a gente acaba sendo extremamente ortodoxo. Tentamos doutrinar as pessoas e isso tem um efeito muito perverso na cultura”, destacou. “Tão importante quanto promover os marcadores de D&I nas estatísticas é criar espaços e cultura que saiba dialogar, reconhecer diferenças e saiba construir colaboração a despeito das diferenças”, complementou.
Para a especialista, o processo de transcender as diferenças passa por fazer reconhecimentos em relação às injustiças que herdamos, mas passa também por criar espaços de cura para prosseguir. “E se a gente entender consenso como uma concordância a respeito de como podemos prosseguir, a despeito das nossas diferenças em tantas outras coisas – dentro dessa definição –, o consenso é bem-vindo”, avaliou.
“Para mim, a área de Comunicação é a mais importante, pois é a área em que corre a circulação, a corrente sanguínea da empresa. Falar de diálogo é falar da cultura de uma organização. Diálogo, consenso, Comunicação Não-Violenta, dizem respeito a uma maneira da empresa tratar suas pessoas. Isso é coerência”, complementou Pamela.
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