EVENTOS
O Triunfo das Paixões
SOBRE
Se é certo que não se deve julgar um livro pela capa e tampouco pelo título, este pode mostrar as intenções e mesmo as qualidades do seu autor. Falar em “triunfo das paixões” a propósito da filosofia de David Hume é nada menos que um achado. Poucos filósofos na história contestaram de maneira tão assertiva o alcance dos poderes da razão, e pouquíssimos chegaram a ponto de definir a natureza do animal humano como essencialmente passional. Hume não disse nem diria irracional, mesmo porque ele confia na razão – até certo ponto. Não como uma qualidade especial, à parte, que põe os humanos acima do resto da Criação, mas como um instinto, uma dotação natural que funciona muito bem, desde que não se abuse de suas (exíguas) capacidades. Esse “instinto maravilhoso” também pode ser, e com frequência o é, causa de uma patologia, tão grave como qualquer outra que aflige o espírito. A voz de Hume uniu-se ao coro daqueles que, como Rousseau ou Kant, consideraram o raciocínio como uma fonte de desnaturação, de perversão dos sentimentos de humanidade. Os filósofos “racionalistas”, Descartes à frente, viram nas paixões um mal, e quiseram purgar a razão de sua influência. Hume traz a boanova: elas são incontornáveis, e, desde que bem dosadas, oferecem o que há de mais essencial e mais deleitoso na experiência humana. É verdade, uma paixão desgovernada leva à fúria e volta as pessoas umas contra as outras, tem um efeito corrosivo na vida social. Ao contrário, o gosto pelas artes, o cultivo das maneiras, o amor à boa reputação, o refinamento da linguagem, tudo isso é parte de uma pedagogia da sensibilidade que nos redispõe ao convívio e permite o desenvolvimento das potencialidades inscritas em nossa natureza. O próprio Hume nunca foi passional em sentido estrito. Cultivando-se a si mesmo e reconhecendo suas limitações como filósofo e escritor, adquiriu uma maestria que lhe permitiu combinar a mais árida especulação a uma expressão límpida e sedutora como poucas. Os ensaios aqui reunidos mostram que Hamilton dos Santos é um intérprete à sua altura, que nos conduz com segurança pelas águas turvas do Tratado da natureza humana e convida-nos a redescobrir um filósofo a um só tempo provocador e cativante. Hume não escreveu para a nossa época, mas muitas vezes temos a impressão, lendo estes textos, de que ele cala fundo, em pleno século XXI, quando se trata de uma de nossas maiores carências: a paciência no trato social, virtude discreta, porém fundamental, sem a qual a sociedade política não poderia subsistir. Toda explicação de um filósofo, toda reflexão elaborada a partir dele e para além dele corre o risco de não fazer jus às exigências que são as suas – sem as quais, a bem da verdade, não poderia haver filosofia. É um prazer acompanhar Hamilton na arriscada empreitada a que ele se lança nestas páginas.
Autor
Hamilton dos Santos
Diretor-Executivo da Aberje
Nasceu em Guaíra-SP, em 1962. É graduado, mestre e doutor em Filosofia pela USP. Jornalista, com passagens pelos principais veículos do país, no início dos anos 2000, especializou-se em Administração de Empresas, com atualizações pela FDC, FGV e Stanford GBS. Trabalhou no Grupo Abril por 20 anos, onde atuou
como Diretor de T&D, Diretor do Curso Abril de Jornalismo e Diretor do Instituto
Abril, tendo idealizado e – construído a Praça Victor Civita, na zona oeste de
São Paulo. É autor, entre outros livros, de Lucio Cardoso – Nem Leviano nem
grave (Brasiliense) e Enfim, grávidos! (Best Seller). Atualmente, é Diretor
Executivo da ABERJE – Associação Brasileira de Comunicação Empresarial.
Atua ainda como conselheiro de diversas organizações nacionais e internacionais, como Poiésis, Pacto pelo Esporte, Global Alliance e Arthur Page Society. Mora em São Paulo.