Chegou a vez da comunicação pública?
No início do ano de 2022, escrevi para um site jurídico sobre o que, a meu ver, afastava-nos do Judiciário do futuro. Em tempos em que tanto se falava do uso de videoconferências e já se iniciava o debate sobre o uso da inteligência artificial, ouvia-se silêncio quando o assunto era comunicação.
Ouvia-se.
Desde sua posse como presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça, no fim de setembro de 2023, o ministro Luís Roberto Barroso tem enfatizado a comunicação como um pilar de sua gestão. Na abertura do 17º Encontro Nacional do Judiciário, no dia 4 de dezembro, voltou a tocar nesse ponto, e foi além: lançou o Pacto Nacional pela Linguagem Simples, um compromisso da magistratura e dos tribunais pela promoção do acesso à informação, por meio de atos e decisões judiciais que possam ser mais facilmente compreendidos.
Alguma conjunção astrológica favorável naquela semana deve ter colaborado para que, dois dias depois, em 6 de dezembro, fosse aprovado na Câmara dos Deputados o PL nº 6256/2019, que institui que órgãos e entidades da administração pública precisam transmitir informações de maneira clara e organizada, garantindo que o interessado encontre facilmente aquilo que procura.
Seria esse um despertar do poder público para a importância da boa comunicação com a população? Estaremos nós, em 2024, um pouco mais conectados ao verdadeiro ideal da comunicação pública e cidadã, que coloca as pessoas no centro dos processos e reflete não só sobre o formato e utilidade do que é transmitido, mas também sobre a interlocução com os públicos?
Em sua fala durante o Encontro Nacional, o ministro Barroso mencionou ainda a necessidade de uma “revolução pela brevidade” ao dizer que o pacto de linguagem inclui pronunciamentos mais curtos e objetivos. Suas palavras ressoaram como música para os ouvidos dessa comunicadora que por quase duas décadas acompanhava eventos em órgãos de Justiça e se perguntava quantas horas de vida a mais teria se fossem somados todos os ritos protocolares de cada uma dessas ocasiões.
Como profissional de comunicação e estudante de psicologia organizacional, refleti muitas vezes sobre o componente cultural de tais ritos, respeitando a tradição de formalismo tão própria do Judiciário. Mas não deixava de me perguntar se sempre precisaria ser dessa forma. Afinal, é inegável que há certo paradoxo entre essa realidade e aquilo que se estabelece em mapas e planos estratégicos que tanto falam de aproximação da sociedade, reconhecimento por eficiência e resgate da confiança.
Confiança, por sinal, é uma palavra importante (para não dizer primordial) quando falamos de Justiça e que guarda intrínseca relação com a linguagem. Na obra “Brevidade Inteligente”, lançada no início de 2023 pelos fundadores da startup americana Axios, conhecida por trazer notícias de forma ágil e otimizada, os autores mencionam que “não há como unir pessoas em torno de uma estratégia ou ideia se elas se distraem ou não entendem o que está sendo dito”. De acordo com eles, quando o assunto é comunicação, “concisão é confiança. Extensão é medo”.
Se isso será, realmente, aplicável a órgãos do Judiciário um dia, não sei dizer.
Mas para que comecemos a avançar, ainda que vagarosamente nessa direção, tenho uma convicção: é preciso mudar a forma como os departamentos responsáveis pela comunicação hoje são percebidos e geridos.
No serviço público, salvo honrosas exceções, tem-se ainda, em vasta maioria, estruturas de comunicação incipientes e meramente operacionais, assoberbadas de afazeres diários que envolvem fotografias, releases, posts e vídeos produzidos sem planejamento e com baixíssimo grau de alinhamento às necessidades de quem busca os serviços da instituição.
Para se comunicar bem, não basta que órgãos do Sistema de Justiça apenas apliquem técnicas de linguagem. É preciso saber empreender leituras de contextos, diagnósticos de cultura, análises de riscos e muita pesquisa e avaliação da experiência do usuário. Em tempos de economia da atenção, são esses os instrumentos que viabilizarão uma comunicação voltada para resultados que, no caso, são o de uma sociedade bem informada e que participa da esfera pública com propriedade e consciência. Profissionais de comunicação não podem ser vistos meramente como técnicos. Devem ser estrategistas, capazes de traçar planos, direcionar esforços e implementar experiências comunicacionais dirigidas para o que (e para quem) mais importa.
O Programa Avançado em Comunicação Pública, parceria da ABCPública com a Aberje, traz um conteúdo vasto e prático e colabora para essa realidade.
Que 2024 seja o ano de valorização da comunicação na Justiça brasileira. Só assim a transformação social será possível.
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