10 de maio de 2011

A comunicação: um novo papel

(Créditos: Unsplash)

O economista escocês Adam Smith (1723-1790), em seu clássico livro A Riqueza das Nações, descreve o funcionamento de uma oficina fabricante de alfinetes, lugar onde o artesão impunha o seu jeito de produzir, livre de qualquer compromisso com o tempo e com metas de produtividade em alta escalam, e propõe um modelo de controle das etapas de produção e do artesão, com objetivo de racionalizar a produção e aumentar exponencialmente os resultados daquelas protoempresas.

O método proposto por Smith foi aperfeiçoado quase 150 anos depois por Frederick Winslow Taylor (1856-1915), em sua revolução científica do trabalho centrada no controle de tempos e movimentos. Com esse tipo de metodologia de trabalho o mundo artesanal foi enterrado. Todos perderam com a instauração de um mundo centrado no trabalho desumanizado: as pessoas e a natureza, que foi degradada.

O século 20 só aprofundou os estragos com as reengenharias e as políticas de downsizing. O resultado deste frenesi produtivo é um mundo sem fraternidade em que o tempo e as relações sociais e culturais viraram outros nomes do dinheiro.

Implicações sobre a comunicação nas empresas

No que tange à comunicação nas empresas, implantou-se uma narrativa autoritária e pobre, constituída de ordens, voltada para controle da informação nas linhas de produção e nos escritórios, que se afastou da autoria. O narrador, lembrando Walter Benjamin, deixou de marcar as suas histórias com a sua voz, o seu ritmo, o seu jeito de contar. Os discursos dentro das empresas ficaram um padrão só e afastado dos relatos mais míticos que incorporam ritos, rituais, mitos, ritos, heróis e anti-heróis. A narrativa interesseira, voltada apenas para os propósitos empresariais, empobreceu o ambiente de trabalho e também as relações entre as pessoas.

Um dos momentos de mudança desse pensamento rasteiro foi a incorporação, no início do século 20, nos Estados Unidos, de preocupações quanto à melhoria das relações do empresariado (denominados na época como os ‘barões ladrões’) com os trabalhadores, imprensa e uma massa de pequenos acionistas, estes, público fundamental para capitalizar as empresas, por meio da bolsa de valores, para os novos desafios trazidos pela expansão do capitalismo nos Estados Unidos e no mundo. Um processo de abertura de capital, que lembra o movimento atual de entrada de grandes empresas brasileiras no universo acionário. Um processo que dá origem às Relações Públicas.

O relações-públicas surge, no ambiente das relações humanas e da comunicação, então, como o apontador de fábrica, no seu caso como padronizador da comunicação e dos relacionamentos. Ivy Lee (1877-1934) fez para as relações públicas o que Adam Smith e Taylor fizeram para a economia: deu início à padronização. O jornalismo do século 20 também foi pela mesma seara e procurou estruturar as suas narrativas em regras e manuais do como relatar. Neste contexto, do que se denominou sociedade de massas industrial, as relações públicas e o jornalismo se transformaram em feitores de diálogos e relacionamentos. Todos a serviço apenas dos grandes poderes organizacionais: o estado, a empresa, a escola e a igreja.

Repensar a comunicação e os relacionamentos

A tecnologia digital e um trabalhador que é inquirido, na atualidade, a trabalhar cada vez mais conhecimentos e uma realidade indutora de controvérsias e inúmeros pontos de vista, em questões que envolvem um novo social, impactado por questões ambientais, sociais e econômicas, tiraram dos poderes do mundo, entre eles a empresa, a centralidade produtora de conteúdos. Agora todos produzem e veiculam as suas opiniões, nem sempre convergentes com as das empresas. É uma sociedade de muitas vozes.

Um universo autoral, que não deixa de ser uma retomada do caráter artesanal da comunicação, que deve procurar se assentar em narrativas mais ricas e abertas (míticas). A grande questão parece ser de como o comunicador se posicionará numa época de grande vontade democrática e articulação entre os chamados públicos sociais.

Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor.

Paulo Nassar

Diretor-presidente da Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (Aberje); professor titular da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP); doutor e mestre pela ECA-USP. É coordenador do Grupo de Estudos de Novas Narrativas (GENN), da ECA-USP; pesquisador orientador de mestrado e doutorado (PPGCOM ECA-USP); pesquisador da British Academy (University of Liverpool) – 2016-2017. Entre outras premiações, recebeu o Atlas Award, concedido pela Public Relations Society of America (PRSA, Estados Unidos), por contribuições às práticas de relações públicas, e o prêmio Comunicador do Ano (Trajetória de Vida), concedido pela FundaCom (Espanha). É coautor dos livros: Communicating Causes: Strategic Public Relations for the Non-profit Sector (Routledge, Reino Unido, 2018); The Handbook of Financial Communication and Investor Relation (Wiley-Blackwell, Nova Jersey, 2018); O que É Comunicação Empresarial (Brasiliense, 1995); e Narrativas Mediáticas e Comunicação – Construção da Memória como Processo de Identidade Organizacional (Coimbra University Press, Portugal, 2018).

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